Desconfiado da campanha da televisão que perguntava sobre “O Brasil que queremos”, um homem, apaixonado pelo seu país, resolveu ele mesmo fazer a pesquisa. E saiu por aí.
O primeiro a ser pesquisado foi um trabalhador na zona rural, sob um sol de rachar, enxada na mão, camisa encardida, rosto magro e suado.
− E daí senhor? Que Brasil você quer?
O homem parou com a enxada e com a palma da mão tirou o suor da testa. Olhou fundo na alma do curioso e falou pausadamente:
− O Brasil que eu quero é um Brasil só de cidades! Sem roça pra capinar que eu já estou de saco cheio. É isso mesmo, sem roça, só cidade grande, tudinho asfaltado e… sem corruptos!
O entrevistador achou um absurdo, mas, gostou da sinceridade do homem. Não discutiu e continuou a caminhar, longe da cidade, até encontrar outro homem, pescando.
− E daí senhor? Que Brasil você quer?
O pescador, sem muito pensar, falou baixo para não espantar os peixes:
− Um Brasil só de sábados, domingos e feriados. Só de pescaria e… sem corruptos!
Um peixinho, perigosamente próximo ao anzol, entrou na conversa e desandou a falar:
− Eu quero um Brasil que respeite o meio ambiente e os animais, sem desmatamentos criminosos. Quero um Brasil com saneamento básico para todos, esgoto tratado, rios despoluídos e… sem corruptos!
Tudo gravado, continuou andando.
Já na cidade o homem encontra uma simpática senhora fazendo uso de uma cadeira de rodas e, com muita dificuldade, tentando se locomover na calçada irregular, esburacada e cheia de degraus.
− O Brasil que eu quero? Deixa-me contar primeiro o que aconteceu comigo… Até algum tempo atrás, eu era uma mulher ativa, bonita e alegre até ser atropelada por um jovem dirigindo uma moto. E olha que eu estava atravessando uma rua usando a faixa de pedestres. Hoje estou assim, dependendo duma cadeira de rodas tentando me locomover nessas calçadas horríveis carregadas de obstáculos. Então é isso. O Brasil que eu quero é um Brasil com cidades humanas, planejadas e acessíveis. Cidades sem mortes no trânsito, onde os idosos, crianças, todas as pessoas sejam respeitadas e tenham direito a uma boa qualidade de vida. Quero um Brasil ético, honesto e… sem corruptos!
Um pássaro empoleirado numa árvore próxima, ouvindo a conversa, se empolgou e, não falou, gorjeou os versos do poeta Gonçalves Dias:
− Quero um Brasil com muitas palmeiras, onde canta o sabiá, o céu com mais estrelas, as várzeas com mais flores, nossos bosques com mais vida, nossa vida com mais amores. Quero um Brasil correto, que respeite a natureza, sem predadores e… sem corruptos!
O homem, bastante impressionado com as declarações até então, continuou a sua andança até encontrar uma figura asquerosa e empoderada… Um corrupto!
− E daí? Qual o Brasil que você quer?
E o homem, irritado, quase aos berros, falou grosso:
−  Quero do jeito que tá! O Brasil não precisa mudar nada! Tá bom assim! Corruptos e corruptores pra todos os lados!  O negócio é encher as malas de dólares e mandar tudo pra conta no estrangeiro! Nada de mais escolas e hospitais! … Quero que o povo se exploda! Se exploda!
O entrevistador ouviu, não comentou nada e saiu de mansinho deixando o corrupto aos berros. Um tanto desanimado, se pôs a andar de volta pra casa quando, no caminho encontra seus entrevistados que juntos haviam decididos fundar o M.C.C.C. – Movimento Contra os Corruptos e Corruptores.
Alertados pelos urros do corrupto, estavam indo de encontro à figura.
Mais à frente, dava-se pra ouvir sons de pancadaria e murmúrios de lamentações:
− Não fui eu… Não sou eu… Não roubei nada… 
 
Laerte Rojo Rosseto é arquiteto e urbanista. Contato: laerterojo@gmail.com

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