Delator do PCC e de esquemas de corrupção dentro da Polícia Civil, Antonio Vinicius Lopes Gritzbach negociou durante vários meses com o Ministério Público de São Paulo a delação premiada que o tornou alvo de criminosos e culminou com a execução dele na última sexta-feira (8), na saída do Aeroporto Internacional de SP, em Guarulhos.
A GloboNews e o g1 tiveram acesso aos documentos em que a defesa de Gritzbach pede uma série de regalias para contar os segredos da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) e de grupos corruptos dentro da polícia.
Além do perdão integral de futuras penas nos processos criminais que enfrentava por lavagem de dinheiro e duplo homicídio, Vinicius Gritzbach pedia desbloqueio de bens como helicópteros, lanchas e carros de luxo.
A alegação do empresário era a de que, embora estivesse envolvido em lavagem de dinheiro da organização criminosa, ele já tinha construído um patrimônio considerado com a negociação de imóveis de luxo em São Paulo ao longo dos últimos anos, antes de iniciar práticas criminosas por intermédio de Claudio Marcos de Almeida, líder do PCC conhecido como Django.
“O colaborador atua no mercado imobiliário de alto padrão desde o ano de 2011 e conheceu Claudio Marcos de Almeida apenas no ano de 2019. Seu patrimônio anteriormente construído não poderia ser genericamente apontado como espúrio”, alegaram os advogados.
No 1° pedido, formalizado ao Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado de São Paulo (Gaeco) em dezembro de 2023, os advogados de Gritzbach fizeram as seguintes exigências:
Liberação dos seguintes itens:
1 Helicóptero Eurocopter Deutschland ano 2001;
1 Lancha Cimitarra 64 pés, ano 2017;
2 motores Volvo;
1 Lancha Motorboat, 39 pés ano 2011;
15 imóveis em nome dele e de suas cinco empresas.
Os advogados também pediram a concessão de visto permanente nos Estados Unidos para ele e os familiares, além de “fomento” para o custeio de segurança e proteção.
Gritzbach também sugeriu liberar apenas um de seus imóveis, avaliado em mais de R$ 2,5 milhões, para o pagamento de futuros ressarcimentos ao estado em condenações por lavagem de dinheiro.
As exigências foram negadas pela Promotoria ainda em dezembro, segundo despacho do promotor Luiz Fernando Rebellatto.
“Os termos sugeridos se apartam completamente de qualquer razoabilidade e das condições subjetivas previstas no artigo 4º, § 1º, da Lei n.º 12.850/2013, especialmente em relação à perda patrimonial de parcela ínfima do patrimônio, bem como da pretensão de isenção absoluta de responsabilidade penal”, disse Rebellatto.
Diante disso, a defesa do empresário formalizou outras duas contrapropostas e a negociação se arrastou até março, quando Gritzbach não conseguiu incluir boa parte das exigências da delação.
Na negociação homologada pela Justiça em junho de 2024, os promotores concordaram em liberar apenas parcialmente o patrimônio que fosse comprovadamente adquirido no começo da carreira do corretor, além de cobrarem dele uma indenização mínima de R$ 15 milhões.
A Promotoria também se comprometeu em colocar Gritzbach e a família no programa de proteção de testemunhas – o que ele não aceitou, segundo o próprio advogado – e perdoar apenas 1/3 das futuras penas por lavagem de dinheiro, concordando que ele recorresse parte dos processos por lavagem de dinheiro em regime inicialmente aberto ou semiaberto.
A concessão de visto norte-americano não foi inserida no documento final de homologação.
Sem perder o estilo de vida
Em entrevista à GloboNews nesta segunda-feira (12), o promotor do Gaeco, Lincoln Gakiya, que participou das negociações da delação premiada confirmou que Vinicius Gritzbach se recusou a entrar no programa de proteção oferecido pelo MP.
Ao conversar com o programa Em Ponto, Gakiya disse que o delator não queria abrir mão do estilo de vida que levava por que, ao entrar no programa, precisaria mudar de casa e deixar de conviver com a família e amigos.
No entanto, um vídeo a que a TV Globo teve acesso mostra que Gritzbach chegou a pedir mais segurança ao Ministério Público de São Paulo (MP-SP) para fechar acordo com promotores contra a facção criminosa e policiais.
No encontro, cuja data não foi informada, Gritzbach disse: “Tenho comprovantes de pagamento, tenho contrato, tenho matrícula, tenho as contas de onde vinham o dinheiro, então dá pra gente fazer o caminho inverso. Tenho as conversas de Whatsapp com os proprietários. Eu apresento, doutor, mas cada vez mais eu preciso de mais segurança. Então, eu precisava de um amparo de vocês também do que eu vou ter. Se não, vocês estão falando com um morto-vivo aqui”.
Ao Fantástico, a defesa de Gritzbach confirmou que foi opção dele de não aceitar a entrada no programa de proteção.
“Ele precisa romper todos os laços com a sua vida, inclusive com o envolvimento com o crime. Ele deixa sua moradia, seu trabalho, os laços familiares e vai para o programa, mas ele se recusou a ir para esse programa”, afirmou o promotor, que é do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado de São Paulo (Gaeco).
De acordo com o promotor, que há décadas investiga os tentáculos do PCC no estado de São Paulo, Gritzbach lavava dinheiro para o crime organizado havia mais de dez anos, através da venda de imóveis, bitcoins, joias, postos de gasolina e fintechs – empresas financeiras digitais. “Ele era um arquivo vivo muito perigoso”, afirmou.
Gritzbach respondia a um processo criminal por duplo homicídio, ao mandar matar um ex-chefe do PCC chamado “Cara Preta’” e o motorista dele em dezembro de 2022, além de vários processos por lavagem de dinheiro. Ele estava em liberdade graças a um habeas corpus do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Execução e mala com joias
Gritzbach foi executado na sexta-feira (9) ao desembarcar no aeroporto em Guarulhos vindo de Maceió. Na bagagem, ele levava mais de R$ 1 milhão em joias e objetos de valor. Segundo fontes da polícia, ele tinha ido à capital alagoana cobrar uma dívida.
Nenhum dos quatro policiais militares contratados como seguranças particulares estava com ele no momento do assassinato. Segundo depoimento deles à polícia, um dos carros que iriam buscá-lo no aeroporto teve um problema na ignição e o outro teve de fazer meia volta para deixar um dos ocupantes em um posto de combustível.
Investigadores desconfiam dessa versão (leia mais). Uma das linhas de investigação é que os seguranças teriam falhado de forma proposital.
Para Gakiya, a morte de Gritzbach em plena luz do dia, dentro do aeroporto mais movimentado do país, foi uma “audácia muito grande” e um “recado” do crime organizado à sociedade.
Fonte: g1
Fonte Diário Brasil Noticias