As Bolsas europeias abrem o dia em tom negativo, ainda poluídas pelas notícias dos EUA de que haveria taxação sobre os mais ricos – se a moda pegar, será uma alternativa para a Europa financiar-se também. Nem os sinais encorajadores dos novos dados econômicos da Zona do Euro conseguem levantar os mercados por lá – o índice dos gerentes de compra IHS Markit (PMI) subiu para sua mais alta em nove meses, com o PMI industrial igualmente em uma alta recorde e o de serviços em sua maior elevação em oito meses. Os futuros americanos, por outro lado, têm uma manhã positiva, recuperando-se do tombo do dia 22, que refletiu o mesmo noticiário sobre a nova tributação de Biden – a notícia influenciou, inclusive, a performance dos ativos brasileiros. A ver…

Tem que vetar isso aí, talkey?
E a novela teve fim! Finalmente, no prazo-limite para tomar a decisão, o presidente Bolsonaro sancionou o Orçamento de 2021 com vetos que somam R$ 19,8 bilhões – a nota informando da sanção presidencial só foi emitida depois das 22 horas do dia 22. Desse total de vetos, R$ 10,5 bilhões se referiam às emendas parlamentares presentes no texto do relator Márcio Bittar (MDB-AC), R$ 1,4 bilhão se tratava de emendas de comissões parlamentares e, por fim, R$ 7,9 bilhões em despesas discricionárias do Executivo (aquelas sobre cujo montante o governo tem algum grau de decisão). Houve ainda um bloqueio adicional de R$ 9 bilhões, ainda não detalhados e passíveis de serem desbloqueados até o fim de 2021.
A notícia, ainda que longe do ideal, deverá ajudar o mercado a se recompor – tiramos o bode da sala. Com isso, poderemos focar na crise sanitária e na retomada de outros assuntos verdadeiramente relevantes, como a retomada da agenda da equipe econômica de Paulo Guedes (Economia), que deverá tentar mais alguns projetos antes de 2022. Imbróglios políticos, como a CPI da Covid, e jurídicos, usualmente provenientes do STF, podem atrapalhar, mas a trajetória deve ao menos ser traçada.

Vem imposto novo na cabeça do americano
Em meio ao zum-zum-zum da Cúpula do Clima, o presidente Biden sugeriu igualar as taxas de imposto de renda e ganhos de capital para os cidadãos americanos que ganham mais de US$ 1 milhão – o anúncio oficial deverá vir na semana que vem, ainda antes do final do mês de abril. O Federal Reserve, banco central americano, sugere que algo em torno de 15% das famílias americanas possuem ações diretamente, usualmente concentradas em círculos familiares de renda mais alta. Ou seja, o que podemos inferir disso? Basicamente, é provável que a maior parte das ações detidas diretamente nos Estados Unidos seja de propriedade das pessoas-alvo do novo imposto.
No final, o presidente americano propõe praticamente dobrar a taxação sobre ganhos de capital para os mais ricos rumo aos 39,6%, combinado com uma sobretaxa existente sobre a renda de investimentos – os impostos federais para os investidores podem chegar a 43,4%. Todo mundo sabia que a Casa Branca queria um projeto nessa linha – não sabemos o motivo de tanto espanto (talvez os investidores só quisessem uma justificativa para realizar suas posições, ou que Biden não fosse tão agressivo ainda em seu primeiro ano). Os programas democratas têm esse viés de nova distribuição de renda por meio de impostos e estímulos fiscais, os quais devem encontrar muita resistência no Congresso, não só de republicanos, mas de democratas mais moderados também. Os planos fiscais do governo Biden devem ser considerados tendenciosos para a redistribuição de “impostos e gastos” em vez de estímulo fiscal.

Debêntures participativas da Vale chamam atenção

Muita gente está de olho nas debêntures participativas da Vale (CVRDA6) . Existentes desde 1997, quando da privatização da companhia, as debêntures participativas ganharam destaque com o aumento de sua liquidez derivado do fato de a União e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) terem vendido seus papéis no mercado secundário no início de abril. Agora com mais liquidez, os títulos são desejados por muitos investidores, principalmente por serem perpétuos e terem sua remuneração associada à mineração da Vale – com a alta dos preços das commodities, o fluxo de caixa para os debenturistas se tornou bastante interessante (fluxo gerado em dólar, ainda que os ativos sejam detidos em reais). Em relatório da Empiricus, estima-se um yield anual para os próximos anos de algo entre 7% e 10%, a depender do preço dos títulos e das condições para a remuneração. Os investidores de varejo viram isso como uma oportunidade bastante interessante, considerando as respectivas restrições de perfil de investimento e afins. Veja em “Fique de Olho” mais detalhes sobre como comprar.

Para variar, nada mudou…
O Banco Central Europeu (BCE) ontem (22) fez o que era esperado e não alterou sua política monetária – não mexeu na taxa de juros e ainda manteve seu programa de compra de ativos. A presidente do BCE, Christine Lagarde, afirmou que a redução da compra de títulos sequer foi discutida – alguns investidores já esperavam uma mudança no discurso neste trecho, na sequência do que aconteceu no Canadá (reduziu a compra de ativos), mas a autoridade monetária europeia não seguiu por esse caminho. Aliás, pelo contrário. O ritmo de aquisições, acelerado recentemente por conta da alta dos juros mais longos, foi preservado. Uma mudança de discurso virá provavelmente apenas depois de as restrições diminuírem consideravelmente, reduzindo a procura por liquidez.

Anote aí!
A agenda brasileira segue mais calma, com a temporada de resultados afetando a performance dos ativos – hoje teremos nomes presentes no Ibovespa, o que poderá movimentar o mercado pelo lado sistêmico. A participação do presidente do BC, Roberto Campos Neto, também será notícia, uma vez que estamos mais uma vez nos aproximando de uma reunião do Copom – uma elevação de 75 pontos-base, rumo aos 3,5% de Selic Meta ao ano, já foi contratada em outras oportunidades.
No exterior, a Zona do Euro divulgou bons PMIs pela manhã, bem como as vendas no varejo no Reino Unido em março, que também foram mais fortes do que o esperado. Christine Lagarde falará novamente hoje depois da decisão de política monetária de ontem, com Janet Yellen e outras autoridades em um painel de mudança climática. Os EUA também contam com a apresentação de seus PMI, bem como a sequência de dados de vendas de moradias. A Rússia anuncia decisão de política monetária, podendo afetar mercados europeus e emergentes.

Muda o que na minha vida?
O início da Cúpula do Clima foi bastante interessante, com o discurso do presidente Bolsonaro surpreendendo positivamente inclusive as alas do governo Biden, como o emissário para assuntos climáticos, John Kerry. Segundo nosso presidente, o Brasil está na vanguarda do combate aos problemas ambientais, o que é bem verdade, comprometendo-se a acabar com o desmatamento ilegal até 2030 e a atingir a neutralidade de carbono até 2050, dez anos mais cedo do que a meta anteriormente firmada. O tom mais conciliatório de Bolsonaro, claro, faz parte de uma nova tratativa juntos aos EUA, de tentativas subsequentes de aproximação. De maneira similar ao presidente do Brasil, diversos países se comprometeram a atingir a neutralidade de carbono nos próximos anos.
Ao convocar uma Cúpula do Clima virtual com 41 líderes mundiais, o presidente Biden mostra como será a abordagem de seu governo contra a mudança climática. Em um discurso de mais de uma hora, o democrata se comprometeu a cortar as emissões de gases causadores de efeito estufa dos EUA em pelo menos metade até 2030, embora a proposta inicial ofereça traços amplos, em vez de uma análise detalhada. A meta representaria quase o dobro do compromisso dos EUA sob o acordo climático de Paris de 2015, quando o então presidente Obama prometeu cortar as emissões em algo entre 26% e 28%, relativamente aos níveis de 2005. A América corporativa está se aquecendo para a nova meta climática de Biden.
Mais de 400 empresas e investidores, incluindo gigantes industriais e de tecnologia, assinaram uma carta aberta que apoiou o corte das emissões de gases de efeito estufa. Gradualmente, mais e mais, a economia verde fará parte de nosso dia a dia, com a abertura de investimentos verdes e renováveis nos mais diferentes mercados. O próprio pacote fiscal americano focado em infraestrutura tem um viés novo rumo à sustentabilidade ambiental. Temas como esse farão parte do dia a dia do investidor contemporâneo.

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Aceita um impostinho sobre seu coquetel climático?