No dia 19 de julho de 2019 a Terra entrou no “cheque especial”, esgotando sua capacidade de renovação de recursos daquele ano, depois de uma série de maus tratos, excesso de poluição, desmatamentos, uso excessivo de agrotóxicos e tantos outros problemas que prejudicam a saúde do habitat humano. O planeta nos deu o sinal de que, se não mudássemos nossa forma de interagir com a natureza, estaríamos em perigo.
Mas, não e não! Isso era bobagem, afinal a Terra sempre se reinventa, seus recursos são inesgotáveis e ela suporta tudo. Afinal, serve para nos servir e nada mais.
Daí em diante, nada mudou, e no final daquele mesmo ano tomou-se conhecimento sobre o coronavírus, na China. Mas, poderia um vírus do outro lado do mundo chegar até aqui? Não e não.
Em março de 2020, o mundo “fechou”. Todos se viram isolados e o vírus tão temido chegou até aqui, afinal, vivemos em uma cadeia que conecta todos os seres vivos e também o meio ambiente.
Com o mundo parado, o céu ficou mais bonito, no silêncio das ruas, podíamos ouvir novamente o cantos dos pássaros, e as espécies voltaram a aparecer nas nossas janelas, como carcarás, canarinhos, jacus e outros. E assim, percebeu-se que com as ruas vazias e a redução de gases poluentes, o ar ficou mais leve. Como consequência, conseguimos aumentar a sobrevida dos nossos recursos naturais e tivemos o marco do Dia de Sobrecarga da Terra apenas em 22 de agosto daquele ano.
Mas, por que o mundo parou? Deveríamos voltar a produzir, e assim o fizemos, afinal, a natureza daria conta do recado, já que ela serve justamente para isso. Não?!
Com o tempo, acreditou-se que o vírus não existia, não era preciso usar máscara e, no Brasil, ele nem era tão agressivo assim… Chegamos ao número de mais de 550 mil mortos.
Mas, não! Isso ainda não era o suficiente.
E, de nossas casas, vimos que o desmatamento e as queimadas clandestinas se intensificaram, mesmo durante uma crise sanitária global, com a esperança de que a Terra se reinventaria e suportaria todos os danos causados. E, assim, continuamos vivendo nos excessos, consumindo muito, gerando muito lixo e causando uma sobrecarga irreversível em nosso ecossistema.
Não e não! Ainda está tudo bem.
E, continuamos seguindo nossas vidas, ignorando que o caos em que nos encontramos é consequência de tudo que temos plantado até aqui. Desmatamos florestas, retiramos o habitat natural de animais, que passam a invadir as cidades, e depois reclamamos dos vírus que eles trazem até nós.
A Terra deu e está dando sinais claros de cansaço. O clima mudou, temos o maior frio dos últimos anos e até mesmo a neve chegou ao Brasil, um país tropical. A água, um recurso abundante e considerado infinito em nosso país, resolveu ficar esgotável e com isso também enfrentamos uma das maiores crises hídricas vistas por aqui.
Não, não e não!
Até quando as negativas das governanças globais e da população, como um todo, continuarão ocultando um problema latente na vida dos seres humanos? Retrocedermos a data do Dia de Sobrecarga da Terra, justamente no período em que voltamos a ocupar as ruas, só mostra o quão grande são nossos impactos na vida e na renovação de recursos em nosso planeta.
A Terra chegou em sua exaustão, mudanças climáticas estão acontecendo a todo momento e o que acontece com um, pode acontecer com todos. Nada nos difere do “todo”, somos conectados e dependemos dos animais, da água e das plantas para sobrevivermos.
Não é a Terra que precisa se renovar, mas sim nós, como sociedade, para pararmos de caminhar rumo à própria extinção.
*Dra. Cristiana Nepomuceno de Sousa Soares é graduada em Direito e Biologia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, em Belo Horizonte. Pós-Graduada em Gestão Pública pela Universidade Federal de Ouro Preto- MG. Especialista em Direito Ambiental pela Universidade de Alicante/Espanha. Mestre em Direito Ambiental pela Escola Superior Dom Helder Câmara. Foi assessora jurídica da Administração Centro-Sul da Prefeitura de Belo Horizonte, assessora jurídica da Secretaria de Minas e Energia- SEME do Estado de Minas Gerais, consultora jurídica do Instituto Mineiro de Gestão das Águas- IGAM, assessora do TJMG e professora de Direito Administrativo da Universidade de Itaúna/MG. Atualmente é presidente da Comissão de Direito de Energia da OAB/MG.