Vira e mexe viajo no tempo e repasso o filme do meu passado. É só ver as notícias na telinha, onde figuras políticas envolvidas em acusações de corrupção contam suas histórias, carregadas de heroísmos, acontecidas durante o governo militar. Foram heróis! Heróis e heroínas por todos os lados, agitando em passeatas, discursando em escolas, bebericando nos botecos. Hoje, os espertos que não foram “pra guerra” estão por aí, vivos e ricos.
Pronto! Isso mexe comigo, pois eu também estive lá. Porém, não como herói, mas como um estudante que acreditava estar fazendo a coisa certa. Eu, entre muitos, protestava.
E, quando volto ao passado, passo o filme todo.
O cenário era a cidade de São Paulo, fria e cinza. A trilha sonora também era cinza. A música mansa, cantada em barzinhos escuros, embalando beijos e abraços, era cinza. As canções cantadas nos festivais, nas passeatas, protestando contra o regime militar, também cinza. Tudo era cinza.
Voltando do passado, tomando uma cerveja no Bar do Escova, quando chega o Osni, um apaixonado por música e violão. Pergunto na lata:
− E daí? Tudo bem? Fala pra mim, qual a cor da “bossa nova”?
Não pensou muito.
− Cinza!
Brindamos à nossa afinidade em relação à cor da música e demos início a uma estranha e divertida conversa, coisa que normalmente acontece em bar, tomando cerveja.
− E a cor do “samba”?
− Samba…a cor do samba… Amarelo???
Concordei, desde que fosse um amarelão vivo, bastante intenso.
– Tropicália?
− Mas tropicália não é música, é um estado de espírito, um clima baiano… mas tem cor. − Tudo colorido! Muitas cores!!!
− Rock??? Nem pensamos muito: − Azul!
E a conversa continuou, musicada e colorida. Entre um brinde e outro, festejamos a cor vinho (tinto) do tango de Carlos Gardel e o cinza “escuro” do fado da Amália Rodrigues, diferente do cinza da bossa nova do João Gilberto.
A Valsa??? Branca! Suavemente, branca, deslizando por salões imperiais!
Da Áustria, da Cici Imperatriz, fomos para a Espanha da Sarita Montiel.
E a cor Do Paso Doble?
− Toureiro…Espanha… Vermelho e dourado! É só energia!!!
Estávamos tentando chegar na cor do “tchá-tchá-tchá” quando o Misael, sem ser chamado, entrou na conversa:
− E a cor do “sertanejo universitário” é marrom, cor de bosta!
Acabou a conversa.
O Osni pegou o violão que estava mudo sobre o freezer da cerveja e foi para uma mesinha na calçada juntando-se a outros dois. Não deu tempo e começaram a cantar …Maçãs do Almir Sater.
Na mesma hora, já saindo para casa, virei-me:
− E daí? Qual é a cor?
− Verde!
…Está chegando o Natal e junto, a figura do velho gordo de barbas brancas acompanhado das canções onde cantam sininhos.
A cor? Vermelha e a branca, que é a mistura de todas as cores.
Laerte Rojo Rosseto é arquiteto. Contato: laerterojo@gmail.com