O que não faltam são expressões populares para dar significados sobre a importância de sairmos da zona de conforto e ir adiante, mesmo que seja aos trancos e barrancos. Se não acreditamos que água parada só cria limbo, podemos recorrer a outras manifestações da memória cultural brasileira para compreendermos que o ponto final é só a pausa para um novo parágrafo.
Na vida, na profissão, nos negócios, na arte, nas amizades, é sabido que quem não se comunica se trumbica e isto tem levado muita gente a ficar sem espaço. Por necessidade evolutiva vivemos em grupos, hoje, também batizados de tribos, uma volta às nossas origens que também passou pela necessária evolução. Não adianta refugar o movimento. Por mais que nos protejamos sempre a vida vai nos empurrar para frente porque a missão é evoluir.
O pior de tudo é que para a maioria dos mortais isso geralmente começa de fora para dentro, quando na verdade deveria começar de dentro para fora. Somos reativos e esperançosos porque, segundo o ditado, a esperança é a última que morre. O escritor Mário Sérgio Cortella nos brinda com uma boa reflexão: “Não confundamos esperança do verbo esperançar com esperança do verbo esperar”.
Ele nos atenta para a postura, individual e coletiva, quanto a assuntos que permeiam nossas vidas e são parte da histórica transição da sociedade. Entre estes assuntos estão a violência, a fome, a corrupção, a ética nas relações e até a política. Quando esperamos que as coisas se resolvam por si, nos postamos tal e qual avestruzes que diante do perigo enfiam a cabeça no buraco do chão.
Porém, quando esperançamos, nós assumimos uma atitude pró-ativa, juntamos forças e buscamos um outro modo para solucionar ou atenuar questões que nos incomodam. Aliás, está aí outra palavra (incômodo) que ganhou ressignificação por meio da neurolinguística e passamos a ser denominada como “dor”. Da sociedade ou da pessoa. Nas palestras, nas seções terapêuticas, nos planejamentos de negócios e até mesmo num recente curso de mídias digitais para jornalistas eu ouvi muito sobre resolver as dores que podem ser da sociedade ou da própria pessoa. A transição, o progresso, o impulso natural das coisas vai quebrando ovos pelo caminho e daí temos que ir limpando.
Tem gente que benze com a mão canhota tudo que é novo, tudo que lhe tira da zona de conforto e acaba sofrendo muito mais do que deveria. Botar panos quentes em situações que requeiram ação imediata é o mesmo que varrer a casa e por a sujeira debaixo do tapete. Não aceitando os fatos como se apresentam e diante de uma imobilidade neutralizadora, por muitas vezes vestimos uma camisa de curar umbigo e saímos por aí como se tudo estivesse na mais perfeita ordem. Não adianta, porque toda solução paliativa que tomamos diante de um grande problema vai resultar no seu retorno e quase sempre volta como bichão, ou seja, maior do que era quando nasceu e sem controle.
Tivéssemos aceitado e entendido o código do universo desde o início o sofrimento seria bem menor, mas há sempre aquela condição do pagar para ver e depois acabamos dando com os burros n’água. Transição pode ter duas vias: para melhor, ou para pior. O bom de tudo é que somos nós os protagonistas desta história e justamente quem vai definir a direção a ser seguida.
Quando delegamos esta situação a outrem nós entregamos uma procuração para que esta pessoa decida por nós e depois choramos o leite derramado. Foi que eu ouvi da Exma. Ministra Eliana Calmon em recente palestra no Teatro Municipal de Marília para advogados e juristas da nossa cidade. “O STF está tomando decisões e até mesmo legislando, coisa que não lhe cabe, porque quem tem a obrigação do fazer, o Senado, foi empurrando com a barriga e encaminhou para a instância superior atribuições que lhe competem por natureza de ofício.
Na falta de quem tome as urgentes decisões, os ministros, instados por ofícios e por uma quantidade assombrosa de processos, acabam decidindo e os reflexos impactam em toda a sociedade. Outro recurso de ilustração da presente situação que a proeminente e entusiasmada oradora utilizou foi comparar os processos decisórios em andamento com o movimento das marés.
Segundo sua análise, depois de um período de ondas com favoráveis ações que estavam nos levando a encontrar caminhos e soluções para relevantes questões políticas e sociais, para a responsabilização criminal de agentes políticos corruptos e dos seus corruptores, e de uma eminente tentativa de tentar passar o Brasil a limpo, a maré está recuando e vai retornar ao leito do mar morno. Temos duas opções: ficar esperançosos ou esperançar.
Tal qual o sábio que ao ser questionado pelo rei sobre um pássaro que mantinha preso em sua mão, e conforme a resposta o sábio poderia ser decapitado ou libertado. Se a resposta fosse está vivo, o rei poderia apertar os dedos e matar a ave, e se respondesse está morto o rei abriria as mãos e soltaria a ave. Diante da situação de saia justa, o sábio respondeu: Meu senhor, a vida desse pássaro está em suas mãos.


Ivan Evangelista Jr é membro da Comissão de Registros Históricos de Marília

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