Às vezes acontecia de Antônio Moura ter bloqueios criativos. Olhava para o papel e não conseguia escrever uma única palavra. Ele se sentava em frente à máquina de escrever, pensava em vários acontecimentos, porém nenhum deles lhe parecia digno de ser registrado. Nessas horas, era como se Antônio não soubesse mais transpor para o texto a vida que ele tanto admirava, o que lhe deixava à deriva de seus pensamentos a vagar pelo mundo. Ele era outro nessas situações de crise.
Não, ele não encontrava inspiração nos momentos em que mais precisava escrever. Tinha crônicas a entregar para três jornais, sabia do que pretendia tratar, mas quando era chegada a hora do trabalho da escrita, então ele não era mais do que uma criança que ainda não conhecia as primeiras letras. Ficava horas se contorcendo em cima de uma frase, que ele reescrevia e apagava, por não encontrar a fórmula perfeita.
Ele não sabia que não há perfeição nesta vida, muito menos na escrita. Algo tão pessoal e único, com todas as imperfeições de cada autor em sua labuta com as letras. Não, Antônio almejava a perfeição, queria ser um deus na arte de escrever. Jamais aceitaria um texto feito de uma tacada só. Como escritor, ele buscava filigranas. Por isso, passava um dia inteiro para terminar um parágrafo, que para ele estava sempre incompleto e que ia para a redação assim mesmo, porque precisava do emprego.
Volta e meia o chefe lhe telefonava:
– Ô Moura, a crônica não sai, não? Preciso dela para amanhã!
– Já está quase pronta – dizia Antônio Moura.
Mas a crônica mal tinha começado.
Era sempre nesse ritmo que o cronista tocava seus trabalhos: com excesso de preciosismo.
Um dia foi chamado para uma conversa com o chefe, dono dos três jornais.
– Você está demorando muito para nos entregar os textos – afirmou Astolfo, o chefe de Moura.
– Ando com crises, bloqueios, não encontro assunto, senhor – queixou-se o cronista.
O que era mentira, pois Moura tinha assuntos de sobra. Seu problema era a mania de perfeição.
– Pois então procure relaxar, dar umas voltas. Você certamente encontrará sobre o que escrever – aconselhou o chefe.
Antônio Moura seguiu o alvitre. Passou a perambular mais pela cidade, sempre em busca do que ocorria no dia a dia. Nesses seis meses que se seguiram, ele produziu belíssimos textos sobre o que havia de mais inefável nos pequenos acontecimentos do cotidiano, embora estivesse cada vez mais insatisfeito com o trabalho.
Enfastiado, decidiu voltar à redação e, ao adentrar a sala do chefe, sentenciou:
– Não posso mais escrever!
– Ué, o que está acontecendo? Como assim, ‘não pode mais escrever’? Você tem produzido crônicas excelentes! – disse o chefe, ainda atônito com aquela aparição repentina.
– É que não consigo atingir a perfeição. Essas banalidades sobre as quais venho escrevendo não valem nada! – esbravejou o cronista.
– Mas você é muito bom, meu caro! Seus textos lembram muito o Braga – elogiou o chefe Astolfo.
– Estou pedindo demissão, não quero mais ser cronista!
E assim Antônio Moura saiu daquela grande empresa de comunicação e sumiu no mundo.
Depois de alguns anos, o chefe soube que seu ex-funcionário havia se tornado professor de redação em uma cidadezinha do interior. Preferia ensinar a escrever de fato.
A verdade é que Antônio Moura escrevia muito bem, lembrou-se o chefe ao reler o último texto do cronista.