Corte reconheceu violação generalizada de direitos fundamentais nos presídios brasileiros e pede ações dentro de seis meses
O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu nesta quarta-feira (4) o estado de coisas inconstitucional no sistema prisional brasileiro e determinou que o governo federal elabore em seis meses um plano de ação para resolver a situação de violações generalizada de direitos fundamentais nas prisões do país.
A decisão foi tomada no âmbito da ADPF-347, proposta em 2015 pelo Psol (Partido Socialismo e Liberdade). A ação foi inspirada em um precedente de 1997 da Corte Constitucional da Colômbia e pede o reconhecimento do “estado de coisas inconstitucional” do sistema prisional, além de medidas para interromper a violação generalizada de direitos humanos nos presídios e proteger a dignidade, a vida e a saúde das pessoas encarceradas.
De acordo com a decisão da Corte Constitucional colombiana, esse tipo de declaração cabe em contextos excepcionais em que há violações graves aos direitos humanos e, ao mesmo tempo, bloqueios institucionais que impedem ou limitam a ação dos demais Poderes.
Plano contra violações em presídios
Pela proposta do STF, o plano federal deverá conter diretrizes para reduzir a superlotação dos presídios, o número de presos provisórios e a permanência no sistema em regime mais severo ou por tempo superior ao da pena. Também deverá propor medidas para adequar a salubridade, as condições de higiene e a segurança das instalações. O ministro Luís Roberto Barroso, presidente da Corte, sugeriu que o documento seja elaborado com a participação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que planeja as medidas que envolvam a atuação do Poder Judiciário. A ideia é que as soluções também abranjam a fiscalização e o monitoramento do sistema prisional.
Com base no plano federal, os estados e o Distrito Federal deverão construir, também em seis meses, planos próprios visando superar o chamado estado de coisas inconstitucional nas prisões. Em ambos os casos, o prazo para a implementação das medidas será de três anos.
Entenda o histórico da ação
Os pedidos cautelares formulados pelos peticionários foram julgados em setembro de 2015 e acolhidos parcialmente pela Corte. O acórdão deste julgamento reconheceu a existência do “estado de coisas inconstitucional” e determinou, entre outras coisas, a implementação das audiências de custódia em até 24 horas após a prisão e o descontingenciamento dos recursos do Funpen (Fundo Penitenciário Nacional) .
Em seu pedido de ingresso no caso como amicus curiae, apresentado em 2017, a Conectas elencou diversos exemplos de como os direitos fundamentais mais básicos são violados no cárcere. De acordo com a entidade, a superlotação é generalizada, a tortura é frequente, as condições são insalubres, não há acesso à água ou à alimentação adequada, não há cuidados de saúde, oferta educacional ou laboral, tampouco assistência jurídica.
A entidade também reforçou no julgamento que o argumento dos peticionários ao demonstrar a inação dos outros Poderes da República diante da crise permanente no sistema prisional
Em 2020, já no contexto da pandemia de Covid-19, o STF foi provocado a se manifestar sobre pelo menos outros dois pedidos cautelares incidentais que demandavam, entre outras coisas, medidas de desencarceramento focadas nos grupos de risco e ações para conter a disseminação do vírus nas prisões. Ambos foram negados.
O caso entrou na pauta de julgamento do plenário virtual em 28 de maio de 2021 e, em sua sustentação oral, o advogado Gabriel Sampaio, diretor de litígio e incidência da Conectas, destacou que as situações descritas em 2015 foram agravadas desde então, especialmente no que se refere às pessoas negras. Ele ressaltou que a sobrerepresentação dessa população no sistema prisional, que já era de inaceitáveis 61%, subiu para 67%, evidenciando o inequívoco uso da legislação penal como instrumento de contenção, repressão e extermínio dos corpos negros.
Sampaio também chamou atenção para o desmonte do sistema nacional e dos mecanismos estaduais de prevenção e combate à tortura, o que implica em descumprimento, pelo Brasil, de compromissos e normas internacionais. Ele reforçou outro aspecto fundamental da ADPF-347, que é a centralidade das audiências de custódia para a denúncia de casos de tortura e maus-tratos e para a contenção das políticas de encarceramento.
Fonte Diário Brasil Noticias