Há meses ele se via numa situação incomum: Não encontrava sentido para suas ações. Tudo lhe parecia em vão. Lia jornais, livros, assistia aos programas de TV, via as pessoas no cotidiano ocupado da cidade grande, mas não havia uma razão para aquele espetáculo de coisas que se lhe apresentavam, pois se sentia de outro lugar, um forasteiro naquela terra vazia em que vivia desde a infância.
Não sabia explicar a origem daquele vácuo que se apoderara de seu ser, como se ele já não fosse mais gente. Alberto apenas desaguava nas mais variadas situações, sua presença era eterna ausência nos acontecimentos mais rotineiros. Ele se perdia na exterioridade do mundo. E, por mais que ele visse as mesmas pessoas todos os dias na repartição, era como se, a cada encontro, ele descobrisse gente nova, pois, para ele, os colegas se diferenciavam ao longo da semana, embora fossem sempre os mesmos, naquele primeiro andar da prefeitura da velha capital fluminense.
Às vezes, saía aos sábados para caminhar pela praia, e a imensidão do oceano lhe causava certo pavor. Ele simplesmente se via seco e apagado diante de tamanha maravilha que, para Alberto, era quase uma entidade fantástica, dessas que a gente ouve nas estórias de Homero. Entretanto, era apenas a vida inconsciente que seguia seu fluxo: passando como fluido que jamais se repete, refletia o solitário Alberto, enquanto fumava um cigarro para se acalmar de sua observação que lhe remetia a Heráclito, filósofo que por anos ignorou depois da faculdade de filosofia. Agora, não esquecia o antigo pensador, porque a existência era justamente devir, e nada mais.
Numa bela e ensolarada tarde carioca, encostado no balcão do quiosque no qual bebericava sua caipirinha, Alberto lembrou-se de Eduardo Marciano, protagonista do romance O Encontro Marcado: “Antes fosse como ele, pelo menos encontraria, no final da estória, a companhia de um religioso”, pensou. Porém, ao contrário do personagem de Fernando Sabino, estava muito mais desorientado e completamente sozinho. Apenas o calor abrasador do Rio de Janeiro era sua companhia naquele lugar. E ele, estrangeiro em sua própria urbe, experimentava o sol a queimar seus pensamentos que já não significavam coisa alguma para sua existência. Vivia porque respirava, seu coração batia, seu cérebro trabalhava. Estava reduzido à biologia, como um cão sem dono, a revirar o lixo da vida que vivia, em busca de restos de alimento para sua alma.
Alguém acabava de tocar no seu ombro:.
– Oi, como vai? – disse o desconhecido.
– Quem é você? – questionou Alberto, como se conhecesse aquele homem de algum lugar.
– Você não me reconhece? – disse o homem, com um sorriso triunfante.
– Não tenho amigos, como poderia reconhecê-lo?!
– Sou Eduardo Marciano, você estava pensando em mim. Vamos àquele botequim da esquina, eu lhe pago uma dose, meu amigo!
– Não duvido de mais nada, nem de sua existência – concluiu Alberto, que acompanhou Eduardo até o bar.
 Alberto finalmente já não estava só.
Encontrara-se com Eduardo em algum lugar onde já não havia mais vazio nem solidão.
 Em algum lugar entre a vida e a ficção, no seu encontro consigo mesmo.
Nos espaços vazios entre os mundos.
No papel abandonado de uma crônica…

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