Por Fernanda Bassette, da Agência Einstein
Um dos maiores desafios para a saúde da mulher no Brasil e no mundo é diminuir o número de cesáreas desnecessárias, que podem colocar em risco a vida da mãe e do bebê. O problema é tão crônico que desde 2014 a Organização Mundial da Saúde reforça as recomendações para a redução desse tipo de parto no mundo com o objetivo de minimizar os riscos de complicações e mortalidade materna. A meta é que 85% a 90% dos partos ocorram pela via vaginal (o chamado parto normal), mas o Brasil ainda está longe disso – o índice de partos normais na saúde suplementar gira em torno de 20%, enquanto na rede pública fica em cerca de 55 a 60%.
Preocupado em reverter essa tendência, o Hospital Israelita Albert Einstein, em uma parceria com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e com o Institute for Healthcare Improvement (IHI), lançou em 2014 o programa Parto Adequado. Ao todo, 35 hospitais privados de todo o Brasil, que tinham diferentes modelos de atendimento à gestante, passaram a definir em conjunto com as operadoras de saúde métodos para melhorar as taxas de cesáreas. Ao final de três anos, o número de partos vaginais saltou de 20% para 32% em média nos hospitais participantes.
O programa chegou a ser estendido para 108 hospitais numa fase 2 (entre 2017 e 2019), mas a melhora nos números de cesarianas não foi a mesma, o que levantou o questionamento sobre por que os objetivos não estavam sendo alcançados com a mesma velocidade da primeira fase do programa.
“Depois de muito esforço percebemos que a estratégia não estava adequada. Estávamos olhando o final da história, quando a gestante dá entrada no hospital para parir. Nesse momento não adianta mais tentar convencê-la da importância do parto vaginal. Parece óbvio, mas se ela não foi orientada no pré-natal, não vai mudar de ideia no hospital”, afirmou Linus Fascina, gerente médico do departamento de Maternidade e Pediatria do Einstein.
Foco na saúde integral da mulher
Assim, o Einstein iniciou fase 3 do programa Parto Adequado com 27 hospitais e operadoras de saúde, desta vez com foco específico no pré-natal para “educar” a gestante sobre a importância e as vantagens do parto vaginal, além da segurança e qualidade do hospital (que envolvem por exemplo a escolha da maternidade adequada). O Einstein começou a testar o modelo com as funcionárias que estão gestantes e a experiência já dura um ano e meio. Mas o que muda afinal?
Segundo Fascina, esse modelo de assistência tem como objetivo cuidar da saúde integral da mulher desde antes de engravidar. Quando ela estiver grávida e iniciar o pré-natal, as consultas realizadas nas primeiras 28 semanas de gestação serão feitas por um médico da família ou por uma enfermeira obstétrica em consultas intercaladas. “Nessa fase, cerca de 94% das gestantes não têm nenhum risco, por isso podem ser atendidas por um médico da família ou uma enfermeira obstétrica”, disse Fascina.
Quando a mulher atingir as 28 semanas de gestação ela deve passar por consultas quinzenais com um médico obstetra até o último mês de gestação, já que os problemas associados à gravidez (entre eles hipertensão e o diabetes gestacional) podem se manifestar nesse período. Além disso, há a necessidade de acompanhar de perto o crescimento fetal, para antecipar riscos de uma prematuridade.
Segundo Fascina, esse modelo é centrado no binômio gestante e feto. “Colocamos o peso para uma responsabilidade institucional do atendimento, ou seja, as gestantes passam a dispor de uma equipe hospitalar e não mais apenas de um único médico.”
“Nesse modelo a gente consegue manter equipes completas e capacitadas para fazer o atendimento como um todo, desde o pré-natal até o momento do parto orientando sobre as vantagens e a importância do parto normal. Um parto vaginal bem conduzido leva de 6 a 8 horas em média [oscilando entre 2 a 20 horas nos extremos] e a mulher fica todo o tempo acompanhada. Passa muito mais segurança”, afirma Fascina, que comemora os primeiros resultados alcançados entre as funcionárias, quer pela satisfação e acolhimento, quer pelas altas taxas de partos vaginais já acima de 55%.
De acordo com Fascina, a “epidemia de cesáreas” ocorreu no mundo todo quando houve um movimento de “hospitalização do parto”, levando as mulheres para dentro dos hospitais e criando um entendimento de que parto seguro é cirurgia. O que não é verdade. “No Einstein já atingimos uma taxa de 48% de partos vaginais entre as gestantes de primeira viagem [primigestas]. Nas mulheres que estão na segunda gestação ou mais gestações essa taxa está em torno de 36% porque ainda existe a crença de que não é possível fazer um parto vaginal depois de uma cesárea”, ressaltou
De acordo com Fascina, a jornada da gestante não se encerra no hospital, pois o puerpério e os primeiros dias do bebê também precisam de acompanhamento para monitorar a como está a amamentação e o crescimento do bebê, além do bem estar mental da mãe. O acompanhamento pode ser feito por telemedicina ou por consultas precoces de 3 a 5 dias após a alta da maternidade.
Escolha da maternidade
A escolha da maternidade é outro fator fundamental para que o parto ocorra de forma segura e da forma escolhida pela mãe. “A gente recomenda que a mulher vá conhecer a maternidade antes mesmo de engravidar. E conhecer a UTI neonatal também é importante, caso haja alguma intercorrência e o bebê precise de assistência”.
A meta do Parto Adequado é atingir 60% de partos vaginais nos próximos três anos – ainda um pouco distante da meta da OMS que é 85%, mas um grande salto diante dos números atuais – e criar junto com as operadoras de saúde manuais para focar no “letramento” das gestantes durante o pré-natal e buscar junto aos hospitais cada vez mais modelos assistenciais centrados na família, na gestante e no feto/recém nascido. “É uma mudança de cultura da gestante e da família e o Einstein já está preparado para isso”, finalizou.