Com o início da vacinação contra COVID-19 no Brasil e, diante da previsível escassez de vacinas a toda população para imunização imediata, iniciou-se uma corrida pela priorização.
Diversos grupos passaram a clamar e justificar por que deveriam constar na lista de prioridades do Plano Nacional de Imunização. Os pacientes de doenças crônicas respiratórias, claro, se incluem nesse movimento. Desde o começo da vacinação, questionam a nós, representantes de pacientes, por que tinham que esperar tanto. As pessoas com asma, ainda que de fora dos grupos de risco, acostumadas a viverem com medo de crises, também sonhavam em estar nessa lista.
A falta de uma diretriz clara do Governo Federal traz brechas para que os Estados e municípios definam suas prioridades. Em Recife, por exemplo, os pacientes de doenças raras conquistaram o direito de serem vacinados de forma prioritária, enquanto que em tantos outros Estados isso não é uma realidade.
A verdade é que não faltam boas razões para priorizarmos diversos grupos negligenciados. Mas, quando tudo é exceção, a exceção deixa de existir. E, quando todos estão com medo e pedem socorro, temos que pensar que há outros motivos além do medo do coronavírus.
Não é por razões subjetivas que os pacientes de doenças cardiorrespiratórias pedem a priorização. Eles sabem que não são tratados de forma adequada, que sua “doença de base” não recebe o devido cuidado do Estado e, portanto, são frágeis.
Os pacientes de hipertensão pulmonar, por exemplo. Muitos deles necessitam de mais de uma medicação para sobreviver, mas com o atual protocolo do Ministério da Saúde, só têm direito ao tratamento com uma medicação. Há mais de 5 anos, esperam por novas medicações que ofereçam melhor qualidade de vida a eles. Já os pacientes de DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica)vêem a incorporação de novas tecnologias de SUS como esperança. Mas há meses aguardam a publicação do protocolo e a devida disponibilização dessas medicações.
Quando olhamos para além da busca por “privilégios”, vemos que a COVID-19 apenas tem escancarado o descaso do Governo com os pacientes de doenças cardiorrespiratórias. Em um cenário de desamparo, a vacina, que pode salvar vidas, é objeto de ansiedade e de muita espera. Pacientes que já estão desesperançosos, sentindo no corpo a falta de mais opções de tratamentos e de um cuidado maior por parte do Estado, veem na vacina um fôlego para continuarem vivos.
*Paula Menezes é advogada e pós-graduada em patient advocacy. É presidente da ABRAF desde 2014 e atuou como vice-presidente da Sociedade Latina de Hipertensão Pulmonar durante sete anos.
*Flávia Lima é jornalista, especialista em Saúde Coletiva pela Fiocruz Brasília e líder da ABRAF em Brasília.