Olá, Leitor D. Vou aproveitar que você chegou e dar uma pausa aqui no violão. Sim, violão. Estava arranhando alguns acordes aqui. Há tempos não tocava violão. Delicioso. Nenhuma música específica, apenas curtindo a sonoridade de algumas posições, sequências do campo harmônico, algumas notas dissonantes, ou seja, apenas me divertindo.
Pela falta de prática, confesso estar enferrujado e, por conta disso, estão saindo uns sons assustadores de tão ruins (risos). E me surpreendi ao realmente rir disso. Perceber que o erro faz parte do processo. Nada mais é do que tentativa de acerto. Prefiro pensar assim. Me desobrigo de tornar algo que dá prazer, que faz bem, em um exercício de tortura.
Digo isso porque em outro momento, num passado recente, faria desse erro um motivo de repetição exaustiva até alcançar a perfeição. A excelência. Ser exímio na execução de uma música em questão. Caramba!
Como o objetivo não era ser nenhum concertista, eu tornava momentos simples de diversão e proximidade com a arte, em uma tremenda furada e tempo desperdiçado com o ego. Um grau de cobrança e auto critica desnecessária que acabava em desistência, abandono do instrumento.
Ao me dar conta disso, ampliei esse raciocínio para outras questões da vida, de pequena ou grande importância, afim de observar se esse comportamento se repetia. Sim. Outras questões da vida eu tratava da mesma forma. Uma necessidade de perfeição e ausência de erros insana. Impossível ser perfeito e feliz. Pelo menos para mim é uma coisa ou outra. Digo perfeito. Eficiente deve ser o ideal. Mas arrancar os cabelos em busca do ápice do ótimo, tem um custo altíssimo. Claro, que essa é minha visão.
Há quem faça do seu objetivo sua própria vida, e nada mais ao redor importa tanto. Nada de errado com isso. São escolhas. Mas para mim a escolha de um foco, de um único objetivo não me encantava. Isso porque deveria deixar outras tantas coisas, e nada de único substituiria todas as outras possibilidades de viver por infinitas vias.
Refletindo agora com você, me veio o seguinte insight: nos momentos em que escolhi ser o ‘ÁS’ em algo, me esforçava, buscava a maestria, mas era muito mais questão do ego. Ser o melhor em algo garante notoriedade, admiração e aceitação. Num mundo carente de atenção isso não é nada mal. Mas a recompensa que vem de fora tem prazo de validade. Prometo que não vou deprimir o papo.
Quanto ao violão ou outras coisas da vida, ao mudar a ótica de obrigação por diversão de aprender, tudo ficou mais leve e gratificante. Não era o resultado final, o objetivo de tocar perfeitamente que fazia sentido, mas cada lição, cada dificuldade superada, cada nova nota aprendida. O ir a aula, a lição de teoria chata que acabava absorvendo, a grana da mensalidade, a rudeza do professor.
O caminhar, o redigir, o compor, é nisso que está a transformação. Onde se aprende, onde se vive, sem presa, sem pressão. Encontrar amor durante, enquanto acontece, e não na espera de um final. Todo sentido está na consciência da progressão e valorização de cada tiquinho de avanço.
Ficou bem mais saudável por essa visão. A desobrigação. Então ao me inscrever num curso de dança de salão, não preciso me envergonhar dos passos desajeitados ou o empenho de ser pé de valsa, mas aproveitar a música, o balanço, toda energia boa disponível na atividade.
Não tem nada a ver com aprender fazer uma nova receita, um prato diferente e ser estrela de um programa gastronômico, mas de provar sabores, cheiros, texturas novas. Degustar o preparo. Observar a paisagem enquanto estou de viagem e não a tensão pela demora da ida. Já gozar com a ida, antes mesmo da chegada ao destino. Eita, se deixar vou ocupar outra página da revista só para dar exemplos (risos).
Bom, agradeço sua atenção, mas vou voltar para o violão agora. Saiba que você acabou me inspirando para uma ideia aqui. Vou ver se dá certo, depois te conto. Qualquer coisa mande um e-mail: ozzy@vozzys.com.br. Até a próxima. Divirta se.
 
Ozzy Issor é músico e radialista. Contato pelo ozzy@vozzys.com.br.

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