Cidade do interior, recém chegado na casa de seus tios maternos, para passar uma semana de suas férias, Rodrigo, procurou se adaptar da melhor forma possível à rotina. Acostumado com o agito de uma cidade grande, percebeu logo de imediato, que não teria muita coisa para fazer naquela cidadezinha, pacata e bucólica.
Tudo se resumia praticamente, em uma praça arborizada, bancos, coreto, fonte luminosa e uma igreja dedicada à São Sebastião. O comércio, não passava de um mercadinho, farmácia, padaria, açougue, bazar, sorveteria e um posto de gasolina. A distração maior, vinha depois do jantar, quando seu tio Rubens, começava a contar suas histórias.
Certo dia, ele contou em detalhes, a história de um benzedor, de nome Domingos, que as mães costumavam procurar com frequência, para benzerem seus filhos recém nascidos e em fase de crescimento. Esses benzedores, segundo seu tio, eram pessoas simples, homens e mulheres que acreditam na fé, para curarem as enfermidades.
Tais como, “quebranto” (mau-olhado), que causa abatimento, fraqueza; “cobreiro”, que causa erupção de bolhas na pele; “espinhela caída”, que provoca vómitos, dor de barrida; “impinge”, que aparece em forma de mancha roxa na pele; “aguamento”, vontade de comer alguma coisa que viu. Entre tantas outras enfermidades.
O detalhe, é que por morar muito afastado da cidade, num lugar praticamente desabitado, era muito difícil encontrar à sua casa, um simples casebre, como costumavam definir aquelas poucas pessoas, que conseguiam tal proeza. Uma missão, que poucos conseguiam realizar, diante da necessidade de encontrar o tal benzedor.
Rapaz curioso, Rodrigo resolveu sair um dia bem cedinho em busca do tal benzedor, que seu tio Rubens mencionara na noite anterior, uma vez que, não achava ser real aquela história. De saída para tal empreitada, foi alertado por sua tia Benedita, para que não fosse muito longe, correndo o risco de se perder.
Antes de se aventurar por lugares desconhecidos, procurou obter informações, sobre o seu Domingos, no pequeno comércio da cidade. Todos diziam praticamente a mesma coisa – Segue pela rua que sai detrás da igreja e vai em frente, até chegar num descampado. Dizem que sua casa, fica por estas bandas.
Dia insolado, com promessa de chuva à tarde, lá foi Rodrigo, sob um sol daqueles de rachar mamona, como se diz no interior. Ressabiado, iniciou sua caminhada por uma rua de terra batida, esburacada, entre crianças soltando pipa e cachorros latindo. Na medida que avançava pela rua quase deserta, raramente avistava alguém, que pudesse lhe oferecer uma informação.
As casas começavam a ficar cada vez mais escassas, aumentando por demais, sua vontade de voltar. Disposto a retornar, avistou um boteco próximo do final da rua. Cansado, suado e com sede, foi logo entrando e pedindo um refrigerante. Para sua surpresa, lhe entregaram uma tubaína, tirada do engradado. Indignado, perguntou – Não têm gelada? Aqui por estas bandas seu moço, não tem energia elétrica. Iluminação só de lampião.
Determinado a encontrar o tal benzedor, foi logo fazendo perguntas. Vocês conhecem um senhor de nome Domingos? Um andarilho, destes que não sai da porta de um botequim, tomou a iniciativa e foi logo dizendo – Desiste seu moço! Este tal benzedor é lenda! Dizem que mora por aqui, respondeu o dono do botequim. Mas eu desconheço.
Noite chegando e ao sair na porta do botequim, para olhar o tempo, um senhor de barba longa e branca, do outro lado da rua, exclamou – Hei moço! Vai desabar um temporal, acompanhado de ventania, raios e trovoadas. Acho melhor você se recolher em minha casa e esperar a chuva passar. Não aconselho seguir em frente.
Há essas alturas, já com alguns pingos de chuva sobre a sua cabeça, Rodrigo, não hesitou em aceitar o convite. Uma casinha simples, acolhedora e uma senhora de nome Luzia, apresentada como sua esposa, arrumando à mesa para o jantar. Se assente conosco, seu moço! Sirva-se à vontade! Com a fome que Rodrigo estava, foi logo se apoderando da polenta, feijão tropeiro, farofa, arroz carreteiro e outras delicias mais.
Olha moço, essa chuva vai atravessar à noite, acho melhor você pousar aqui e seguir sua caminhada amanhã cedo. Você tá indo pra onde? Na realidade, estou procurando por um benzedor, de nome… Antes mesmo, que terminasse de concluir a frase, foi interrompido pelo senhor, que disse – Seu Domingos, benzedor, à sua disposição. Qual o seu problema?
Neste instante, foi acordado pela sua tia Benedita, dizendo – Acorda meu sobrinho, você não vai tomar o café da manhã? Hoje têm café de bule, manteiga caseira, pão de forno, bolo de fubá e leite com nata. Estamos esperando por você! Neste instante, Rodrigo percebeu que tudo não passou de um sonho.
Depois de uma ducha e tomar o café da manhã, resolveu sair e foi até a praça da igreja, se sentou em um banco e ficou pensando em tudo que sonhara na noite anterior. Quando para sua surpresa, um senhor de barba longa e branca se aproximou e disse – Hei moço! Você me empresta sua caixa de fósforo, para eu acender meu cigarro de palha?
Sem fazer nenhuma pergunta, com receio da resposta que poderia advir, entregou-lhe o que pedira e ficou olhando o senhor acender o cigarro. Num gesto de gratidão, devolveu-lhe a caixa de fósforo e disse – Seu Domingos, a seu dispor!
Carlos R. Ticiano é advogado, romancista e colunista.
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