Antigamente, era comum os pais arrumarem os pretendentes que achavam ideais para seus filhos, ajeitando o namoro, noivado e o casamento, entre famílias conhecidas da mesma estirpe. Isso acontecia com frequência, entre os patriarcas de famílias tradicionais paulistanas, denominadas de “Barões do Café”, que residiam em casarões na avenida Paulista.
Desta forma, os pais de Rosana e os pais de Rodolfo, no ramo da cafeicultura (plantação de café), acertaram de forma arbitrária o namoro entre seus filhos, sem ao menos consultá-los, visando apenas o interesse mútuo entre as famílias, conhecidas de longa data. Diante de tal situação, Rosana evitava de todas as formas de se encontrar com seu pretendente, dando muitas vezes, desculpas esfarrapadas.
Com o pretexto de rever seus avós maternos Conchetta e Franchesco, apesar da guerra no continente europeu, Rosana viajou de navio para a Itália. Em sua estadia na casa de seus avós, entre vários passeios, foi visitar a Fontana di Trevi (Fonte de Trevi). Diante da tradição local, jogou uma moeda na fonte e fez o pedido para encontrar um verdadeiro amor. Depois de alguns meses, mesmo a contra gosto, Rosana embarcou de volta para o Brasil.
Em seu retorno, Rosana viveu outra aventura marítima perigosa, considerando que muitas embarcações que atravessavam o Oceano Atlântico, devido à guerra, estavam sendo bombardeadas. Entre os passageiros do navio, teve a oportunidade de conhecer Renato, um jornalista brasileiro, que viajara com seu colega Ricardo, fotógrafo, à serviço do jornal em que ambos trabalhavam, para cobrirem à guerra na Europa.
Jovem, decidida e obstinada, não se conformava com certos conceitos arcaicos, que ainda predominavam no Brasil, diante das novidades que não só presenciou como viveu, em sua permanência na Europa. Em decorrência de um flerte com ares de namoro, que surgiu entre ambos, que pensavam exatamente iguais, passaram a se encontrar de forma discreta e secreta.
Sem expor nada ao seu namorado Rodolfo e as seus pais, uma vez que eles nunca entenderiam sua atitude, Rosana tentava encontrar uma forma de colocar um fim naquele noivado de fachada. Por ter um irmão mais velho, que cursava direito, certo dia foi com ele até a república que ele costumava frequentar, onde se hospedavam seus amigos de faculdade.
Alguns prestes a se formarem, já exerciam cargos em suas respectivas áreas de estudos. Entre eles, Roberto, que fazia jornalismo e já escrevia alguns artigos para um jornal da cidade. Muito embora, com certa resistência dos editores, uma vez que seus artigos muitas vezes polêmicos, traziam riscos de ter toda edição recolhida e o jornal ainda ser fechado pela censura.
Numa dessas suas idas a república, certa vez ficou diante de uma saia justa, devido a uma situação embaraçosa, ao se deparar com uma determinada pessoa. Ao baterem à porta, Roberto foi abri-la e deparou-se com Renato, o jornalista que Rosana tinha conhecido na viagem de volta ao Brasil. Preciso falar com você Roberto! Pode dizer Renato, estamos entre amigos. Mas o que aconteceu?
O artigo que você publicou, foi censurado mais uma vez pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), criado pelo governo do presidente Getúlio Vargas. Tivemos que recolher às pressas, toda a edição do jornal. Tenho receio de que desta vez o jornal acabe fechado. Você pegou pesado Roberto. Mas o que eu disse é a pura verdade! Um silêncio pairou no ar.
Em contra partida, dois olhares que foram flechados recentemente pelo “cupido do amor”, insistiam em se cruzar. Apesar de constrangida, pelo encontro casual, Rosana não se furtava de olhar discretamente para Renato, que mais comedido ainda, tentava não corresponder aos olhares. Dizendo ter um encontro com suas amigas na Confeitaria Vienense, Rosana pediu licença e se retirou.
Passados alguns dias, Rosana tomou a decisão de terminar o noivado com Rodolfo. Mas como era de esperar, não foi um diálogo fácil. A certa altura da conversa, Rosana exclamou – Como posso gostar de uma pessoa tão retrógada, a ponto de não aceitar a ideia de uma mulher dirigir, de trabalhar numa indústria fabril, de ter direito ao voto? Eu não gosto de você! Eu não posso continuar vivendo essa farsa.
Seus pais já sabem sobre à sua decisão Rosana? Ainda não Rodolfo! Mas vão saber logo mais à noite. A informação sobre o término do noivado e o romance com Renato, caiu como uma bomba, dizimando todos os planos de seus pais. Como represália, Rosana foi enviada de volta para à Itália. Com receio de que nunca mais pudesse encontrar Renato, através de uma amiga, conseguiu avisá-lo sobre o que tinha acontecido.
Aproveitando sua permanência em terras italianas, Rosana resolveu retornar Fontana di Trevi (Fonte de Trevi), famosa mundialmente pela tradição de se ter um desejo realizado. Com lágrimas no rosto, fechou os olhos e como manda a tradição italiana, refez o pedido anterior, só que desta vez para reencontrar Renato, o grande amor de sua vida.
Passado algumas semanas, Rosana teve a intuição de voltar novamente à praça, onde fica localizada à fonte dos desejos. Sentada, de cabeça baixa, pensativa, foi surpreendida por um rapaz de barba, tentando se comunicar com ela em italiano – Per favore! (Por favor!) Posso parlare con te? (Posso falar com você?). Assustada, Rosana exclamou – Renato!
Como você conseguiu me encontrar aqui na Itália? É uma longa história, meu amor! Sua nonna Conchetta me ajudou. Depois de um longo beijo, saíram de mãos dadas rumo ao futuro, na esperança de viverem um grande e eterno amor.

Carlos R. Ticiano é advogado, romancista e colunista.

Compartilhar matéria no
A fonte dos desejos