Artigo por Carlos R. Ticiano
Talvez pelo fato, de morarem na mesma rua, tendo suas casas próximas uma da outra, Lucas e Letícia, estavam sempre juntos, compartilhando suas brincadeiras, aventuras e travessuras. Como se já existisse um namorico, de certa forma inconsciente, desses tantos que acontecem na pré-adolescência, que antecede à adolescência de todo jovem.
Por estarem matriculados no mesmo colégio e estudarem na mesma sala de aula, costumavam irem sempre juntos para escola. Sentado na fileira do lado, à quatro carteiras atrás de Letícia, Lucas promovia um festival de bilhetinhos, muitas vezes, interceptados pela professora Camila. Sem falar dos aviõezinhos de papel, que Lucas disparava em direção à Letícia.
Certa vez, a pedido de sua mãe Marta, Letícia acompanhada de Lucas, foram até a padaria comprar um bolo de chocolate para o lanche da tarde. Diante daquela variedade exposta de doces, não resistindo ao apelo de seus olhos, compraram e degustaram ali mesmo, seus doces preferidos. De volta da padaria, ao perceber que os dois estavam, “com cara de gato que quebrou o vaso”, Marta pensou em questionar Letícia, mas desistiu da ideia ao ver a boca dos dois lambuzada.
O tempo passou e quando Letícia completou quinze anos, seus pais deram uma festa, com direito a valsa e um belo anel de debutante. Tudo para comemorar e marcar a transição de um novo ciclo em sua vida e o início de uma nova etapa rumo à vida adulta. Apesar de todo chamego que existia entre os dois, ainda não eram namorados declarados, mas era possível perceber que tudo era uma questão de tempo.
Podia se ver claramente, que despontava um romance promissor no horizonte dos seus olhos de adolescentes. Lucas, só esperava uma oportunidade para se declarar. Passados alguns dias, como de costume, Lucas saiu em direção à casa de Letícia, para convidá-la à andar de bicicleta. Para sua surpresa, reparou que havia um caminhão de mudanças em frente. Quando pensou em entrar, percebeu Letícia vindo em sua direção.
Antes que Lucas pudesse perguntar o que estava acontecendo, Letícia exclamou – Estamos de mudança! Meu pai foi transferido para trabalhar em uma sucursal, numa cidade de Minas Gerais. Eu sei, disse Letícia, que existe algo muito especial entre nós dois e que mais cedo ou mais tarde, seríamos namorados. Sinto isso em meu coração e o vejo refletido em seu olhar.
Não diga nada Lucas, apenas aceite está correntinha com um pingente de coração, que representa um romance que não tivemos a oportunidade de vivê-lo, apesar de que desde a nossa pré-adolescência, sempre fomos namoradinhos. Não quero chorar e nem tão pouco dizer adeus. Quem sabe um dia nossos caminhos se cruzem.
Com um olhar de despedida, Lucas presenciou Letícia com lágrimas nos olhos, partindo num breve aceno de mão. De volta à realidade, hora de refazer os planos e pensar no futuro que à vida os aguardavam, independente de qual caminho fossem seguir. Os anos passaram, por continuar acalentando uma remota esperança, de que algum dia reencontraria Letícia, Lucas nunca firmou namoro com nenhuma garota.
Pelo fato de residir em uma casa ornamentada, por um bonito e admirado jardim, que sua mãe Ivone cuidava pessoalmente, com sua eventual ajuda nos finais de semana, Lucas acabou optando por ser um arquiteto e se formando em Arquitetura e Urbanismo. Por gostar de plantas, se especializou em Paisagismo.
Atividade que busca a projeção e a idealização, entre elas, de parques, jardins e praças em locais públicos. Como também, na criação de áreas bonitas, com belos jardins, repletos de plantas em ambientes residenciais. Tornando o cenário harmonioso em todos os aspectos, trazendo bem estar às pessoas que ali habitam ou frequentam.
Paisagista conhecido e renomado, foi convidado por uma construtora, para idealizar e executar um projeto de paisagismo em um condomínio residencial. Por se tratar de um empreendimento a ser executado na cidade de Uberlândia, Lucas teve que refazer seus compromissos na capital paulista, para poder aceitar o convite.
Hospedado em um hotel, foi conhecer a obra, que por sinal, se encontrava na reta final de sua finalização. No dia em que se apresentou ao seu Mário, engenheiro civil, este o notificou de que ele trabalharia em parceria com uma designer de interiores. Uma vez que, antes de iniciar as vendas, teriam que ter um apartamento todo decorado em exposição.
Ao entrar no escritório para se pôr a par dos detalhes do empreendimento, seu Mário foi dizendo – Letícia! Quero que você conheça o Lucas, ele é arquiteto paisagista e vai trabalhar em parceria com você, que como designer de ambientes, vão planejar e executar o trabalho em conjunto. Neste instante, um silêncio pairou no ar.
Para surpresa de ambos, um flashback os levou de volta ao passado, fazendo-os visualizar imagens que ficaram guardadas no subconsciente de suas memórias. Seu Mário, sem entender nada do que estava acontecendo, perguntou – Vocês já se conhecem? Responderam praticamente juntos – Desde a nossa pré-adolescência.
O reencontro trouxe a certeza, de que aconteça o que acontecer, alguns destinos uma vez traçados, jamais se desvencilhará. Lucas, emocionado perguntou à Letícia – Você se lembra dessa correntinha? Visivelmente comovida, com um sorriso nos olhos, respondeu – Vamos reiniciar nosso namoro de infância e transformá-lo num romance eterno?
Carlos R. Ticiano é advogado, romancista e colunista.