Artigo por Carlos R. Ticiano

Poucas pessoas talvez tenham o conhecimento, de que durante a Primeira Guerra Mundial (1914 a 1918), considerada por muitos como a mais terrível das guerras, existiu uma breve trégua, denominada – Trégua de Natal. Algo inimaginável e improvável, aconteceu naquele mês de dezembro, uma vez que ela tenha sido deflagada a apenas cinco meses.
Segundo narrativas de Marmaduke Walkinton, um soldado britânico que estava na linha de frente na véspera de Natal, cantando canções natalinas com os demais companheiros, ouviram os alemães também cantando. Quando para surpresa de todos, um soldado alemão exclamou – Amanhã não atirem, nós não atiraremos! Os soldados não só deixaram de atirar, como também trocaram presentes.
Muito embora, essa trégua não tenha sido oficial, soldados de várias unidades da Frente Ocidental participaram deste cessar fogo, onde soldados franceses e belgas também aderiram a iniciativa dos soldados britânicos e alemães. Naquela região conhecida como Terra de Ninguém, nessa época do ano faz muito frio, deixando toda aquela área completamente congelada, a ponto de se criarem condições de uma trégua, atrelada a uma suspensão temporária das hostilidades.
Narra o historiador Alan Wakefield, que enquanto os alemães cantavam Stille Nacht, os ingleses cantavam Silent Night, que significa duplamente “Noite Silenciosa”, conhecida como Noite Feliz no Brasil. Na manhã seguinte, no dia 25 de dezembro, os alemães começaram a sair das trincheiras e a caminharem de um lado para o outro, a ponto de se aproximarem das trincheiras britânicas.
Aos poucos, os soldados de ambos os lados, começaram a conversar, sem portarem armas e a se cumprimentarem apertando as mãos. Alguns mais sensibilizados, saiam de suas trincheiras oferendo produtos, como chocolates, uísque, bolos, cigarros, salsichas, conhaque, biscoitos. Uma cena única e rara em que a guerra fora esquecida durante um dia chuvoso, nublado e gelado, relata o historiador.
Na realidade, essa trégua foi uma oportunidade de ver o rosto do inimigo, uma vez que entrincheirados, não se conseguem visualizar o oponente. O idioma, não foi um obstáculo, uma vez que vários soldados alemães falavam bem o inglês, por terem morado em terras britânicas, enquanto outros ainda moravam, mas devido a eminência da guerra, tiveram que retornar à Alemanha.
Relatos de alguns soldados britânicos, afirmam que alguns soldados alemães tinham sidos barbeiros e garçons em Londres, e que esperavam regressar em breve, assim que a guerra acabasse. Além de repartirem víveres, surgiu do nada, uma bola vinda das trincheiras alemã, relata Ernie William, que fazia parte do regime britânico. Não foi realizado propriamente um jogo de futebol, apenas uma brincadeira entre os soldados, que corriam apenas para chutarem à bola.
O historiador Alan Wakefield, diz que existem poucas evidências de que tenha realmente surgido uma bola durante a trégua natalina, mas as cartas de alguns soldados britânicos relatam à existência de uma bola, onde os soldados apenas chutavam à bola de um lado para o outro. No início do ano de 1915, relata o historiador Anthony Richards, que os jornais começaram a divulgar tal feito, mencionando em suas páginas transcritos de cartas e fotos, enviadas pelos soldados às suas famílias.
Não deixou de ser um momento único e de lealdade entre ambas às partes, talvez pelo fato de a guerra ainda estar apenas no início, e de um sentimento de humanidade, ter se apoderado dos soldados, que certamente não queriam estar naquele front. O fato de pessoas nunca terem participado direta ou indiretamente de uma guerra, até hoje não acreditam que essa trégua tenha realmente acontecido.
Diante do episódio, pelo lado dos oficiais superiores, houve uma certa apreensão, uma vez que a trégua poderia fazer com que os soldados de ambas às partes, percebessem que o inimigo não era exatamente um inimigo. De certo mesmo, é que a trégua chegou ao fim, e as ordens de recomeçar a guerra foi dada pelos comandantes superiores. Era hora da artilharia e das armas voltarem a imperar no campo de batalha.
Segundo o historiador Alan Wakefield, um militar, que recebera ordens de um oficial britânico, para bombardear uma fazenda onde provavelmente os alemães usavam para estocar comida, surpreendeu a todos os seus comandados. O militar que participara da trégua natalina, decidiu enviar um soldado inglês para que avisasse os alemães sobre o bombardeio que seria realizado, salvaguardando assim suas vidas. Eles fizeram amigos no Natal e não queriam atirar neles.
Comovido com o relato da Trégua de Natal, Paul MacCartney compôs a música Pipes of Peace (Cachimbos da Paz) e Wonderful Christmastime (Natal Maravilhoso), como forma de enaltecer o significado da paz. Mas, diante do que tenho ouvido atualmente nos telejornais, a Terceira Guerra Mundial é uma questão de tempo, devido aos desentendimentos entre às nações, desencadeados principalmente pelos conflitos entre a Rússia e a Ucrânia. Por isso, achei oportuno transcrever este relato.
De uma forma imatura, irracional e desumana, se considerando um semideus, o homem se dá o direito de destruir aos poucos o planeta, e por tabela, os seres humanos, através de várias formas, entre elas a guerra. Poderíamos enumerar uma lista infindável de motivos pelo qual a “paz” é tão odiada e a “guerra” tão amada. Porque será que somos assim!

Carlos R. Ticiano é advogado, romancista e colunista.

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Trégua das hostilidades