A censura das redes sociais do ex-deputado estadual paranaense Homero Marchese (Novo-PR) imposta por decisão do ministro Alexandre Moraes teve origem em uma suposta “denúncia anônima” produzida, paralelamente, pelo próprio gabinete do ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que utilizava, informalmente, o setor de combate à desinformação contra investigados no inquérito das fake news, instalado no Supremo Tribunal Federal (STF).
A revelação veio à tona nesta quarta-feira (21) em mais uma reportagem do jornal Folha de S.Paulo, com base em mensagens trocadas por Airton Vieira, braço direito de Moraes no STF e Eduardo Tagliaferro, então chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação (AEED) do TSE.
Além da “denúncia anônima”, o gabinete de Moraes foi responsável pelo bloqueio das redes sociais do político após um equívoco sobre a autoria do posts alvos da investigação. Marchese ainda alega que sequer foi notificado ou teve direito à defesa. O ex-deputado também não era investigado pelo inquérito da fake news, o que aponta para arbitrariedade e contradição do ministro no processo que correu em segredo de Justiça até se tornar público no escândalo do Twitter Files, revelado pela empresa de Elon Musk.
Marchese entrou na mira de Moraes após publicar um banner sobre a participação de ministros do STF como palestrantes em um evento sobre democracia e liberdade no Brasil, realizado no Harvard Club, em Nova York, no dia 14 de novembro de 2022. Na véspera do encontro nos Estados Unidos, o ministro do Supremo determinou o bloqueio das contas do ex-deputado paranaense em ofício encaminhado ao Twitter Brasil com prazo de duas horas para o cumprimento da decisão sob pena de multa diária de R$ 100 mil.
De acordo com Moraes, a divulgação poderia configurar os crimes de “incitar, publicamente, a prática de crime” e o de “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito”
As mensagens reveladas pela Folha apontam que no dia 12 de novembro, o assessor do ministro do STF Airton Vieira encaminhou mensagens a Tagliaferro pelo WhatsApp com arquivos de suposta manifestação articulada com a divulgação de endereços dos hotéis dos magistrados brasileiros, além de um post com a frase “máfia brasileira”.
“Eduardo, por favor, consegue identificar? E bloquear? O Ministro pediu… Obrigado”, escreveu o braço-direito de Moraes, que ainda acrescentou, conforme o diálogo revelado pela Folha: “urgente, em razão da data”. “Só não sei como bloquear pelo TSE pq não fala nada de eleições”, respondeu Tagliaferro, que produziu o relatório que aponta para a denúncia anônima para investigação.
No entanto, o alvo da investigação era a reprodução do post de Marchese compartilhado e editado por outro usuário com a expressão “máfia brasileira”, o que levou à suspensão das redes sociais do então parlamentar sem possibilidade de apresentação de defesa. Em processo aberto por indenização por danos morais, Marchese compara os posts e confirma que a imagem original tinha caráter informativo.
De forma objetiva, direta e sem absolutamente qualquer juízo de valor, o autor comunicava à comunidade brasileira em Nova York o local da palestra dos ministros. Para tanto, apenas reproduzia informação pública, divulgada pelos próprios organizadores do evento e que continua no ar até hoje no site do evento”, esclarece a defesa de Marchese no processo.
Depois da suspensão das contas do Twitter e Facebook, o Instagram do ex-deputado também foi retirado do ar. Após várias tentativas de entrar em contato com as plataformas, Marchese conseguiu informações sobre o processo no STF e confirmou que outra postagem apócrifa foi considerada de autoria do político paranaense. Nem a frase “oportunidade imperdível” no post original do ex-deputado escapou da investigação, pois a ironia foi considerada uma possível sugestão para “convocação de ações hostis e intimidatórias” contra os ministros do STF.
Fonte: Gazeta do Povo