
Reprodução Sociedade Militar
Em uma de suas primeiras apresentações públicas sem a farda verde-oliva, realizada no último dia 25 de novembro no Palácio Duque de Caxias, o General de Exército (R1) Richard Fernandes Nunes fez uma análise crua e reveladora sobre os desafios recentes enfrentados pela Força Terrestre.
Transferido para a reserva remunerada há poucos meses, o oficial não se afastou do centro das decisões: ele revelou que continua atuando no Ministério da Defesa, agora à frente do Censipan (Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia).
Richard Nunes aproveitou o painel sobre comunicação estratégica para admitir que a coesão interna do Exército sofreu danos em meio à polarização nacional e criticou duramente o comportamento da tropa no ambiente digital.
A revelação: “houve dano, sim”
Apesar de ocupar um cargo de confiança no Ministério da Defesa, Nunes evitou o discurso institucional padronizado ao ser questionado sobre o estado da tropa. Ele reconheceu explicitamente os abalos sofridos pela instituição nos últimos anos.
“Não vou aqui dourar a pílula que não foi afetada. Claro que foi, de qualquer instituição. Houve dano, sim, houve abalos a coesão por causa desse tipo de comportamento,” declarou o general. Mas, quanto a visão da sociedade, Richard sai em defesa dos militares e disse que não há coerência em comparar o Exército com instituições religiosas em pesquisas de opinião.
“a gente perde pra igreja, que não é comparação válida. Como é que eu vou comparar a Força Armada com uma igreja? São, mas as pesquisas fazem isso, né?”, disse.
Para o oficial, a quebra da hierarquia tradicional da informação é um dos vetores desse problema. “Hoje o soldado lê a notícia ao mesmo tempo que o general, pô. Se ele não for educado a interpretar aquela notícia de uma maneira correta, ele vai consultar determinados meios […] que vão simplesmente dificultar em muito o exercício da liderança com ética.”
Do Alto Comando para o Ministério da Defesa
O General fez questão de situar sua fala a partir de sua nova perspectiva. Ao iniciar a palestra, destacou a emoção de retornar ao auditório: “É a primeira vez que venho sem uniforme, é a primeira vez na reserva”. No entanto, ao final da explanação, reforçou que sua missão continua dentro do governo.
“Estou agora no Censipan… e é um órgão da defesa e continuamos pautados pelos mesmos valores e as mesmas preocupações,” afirmou Nunes, detalhando inclusive planos estratégicos atuais, como a parceria para levar o Instituto Militar de Engenharia (IME) para Manaus.
As “Gatilhadas Digitais” e militares viraram “jornalistas frustrados”
O general apresentou o conceito de “Mundo PsiC” (Precipitado, Superficial, Imediatista e Conturbado) para descrever o cenário que desafia a hierarquia. Nunes desenvolveu essa teoria em artigos publicados há cerca de dois anos. Segundo o general, esse ambiente transformou militares em “jornalistas frustrados”, ansiosos por repassar informações sem checagem, o que classificou como “gatilhadas digitais”.
“Recebe uma postagem, não sabe quem escreveu… mas já disparou pro grupo da turma dele, porque ele quer ser o primeiro a dar notícia. […] Aí faz aquela lambança superficial, água na canela, não estuda nada, mas sabe tudo. Entende de vacina, entende de urna eletrônica… Não sabe nada, mas entende tudo.”
Generais no Twitter: comportamento “Inaceitável” e medidas disciplinares
Um dos pontos mais críticos da palestra foi o ataque à postura de oficiais-generais da ativa nas redes sociais, Richard mencionou o Twitter e até as medidas disciplinares, o que significa que membros do alto escalão sofreram punições quando ele chefiava a comunicação do Exército.
“Era inconcebível um general da ativa do Exército Brasileiro ter um perfil e publicando coisas nesse perfil. Inaceitável,” disparou. “Vai dar problema. General não publica Twitter na ativa escrevendo sobre temas gerais.”
O general, que mencionou que várias instituições militares foram proibidas de usar redes sociais, rechaçou comparações com outros exércitos: “Outro país é outro país, meu filho. Isso aqui é Brasil. […] Aqui, se um general tem um perfil com seu nome e fica escrevendo coisas na mídia social, isso vai ter uma consequência.”
Crítica aos “Gurus” e Influenciadores ex-militares
Richard Nunes também mirou nos “especialistas” e influenciadores digitais — muitos deles ex-militares, que tentam tutelar o Comando.
“Tem muito inventor aí, muito especialista hoje em dia que fica dando conselhos… ‘Ah, por que que vocês não fazem isso?’ […] Cuida da tua cadeira que já tá de bom tamanho.”
“Tem gente que sai das Forças Armadas porque não se adaptou a uma vida militar… e de agora começa a ter um canal com milhares de seguidores falando de como deve ser a vida no exército. […] E fica os, desculpe a palavra, os trouxas seguindo esse tipo de gente.”
O pessoal está alucinado – a “Venda” do Forte de Copacabana
Para ilustrar o perigo da desinformação, o general, agora no Censipan, citou um episódio onde foi cobrado por colegas da reserva que acreditavam em fake news sobre a venda do Forte de Copacabana.
“O pessoal tá tão alucinado e acredita nessas bobagens. […] Aí eu falei: ‘Pô, cara, tu vendeu forte Copacabana? Nós vendemos forte Copacabana. Você ficou com o dinheiro todo, cadê a minha parte?’ […] Como se o exército brasileiro pudesse se desfazer de um bem como forte Copacabana.”
A palestra terminou com o oficial reforçando que, mesmo na reserva e atuando no Censipan, a vigilância sobre a integridade da informação e a coesão da força permanece sua prioridade.
Robson Augusto – REvista Sociedade Militar
com informações de Sociedade Militar
Fonte: Diário Do Brasil
