
Na cidade em que Claudia Leitte passou de cantora adorada para persona non grata em poucos dias por trocar a letra de uma música para prestar homenagens a Jesus Cristo, um vereador – Cezar Leite (PL) – resolve propor um projeto de lei contra a cristofobia, sugerindo uma política pública que iniba ações discriminatórias a cristãos.
A Câmara Municipal de Salvador promoveu audiência pública sobre o projeto de lei, da qual participei ao lado de autoridades seculares e religiosas. Representei o Instituto Brasileiro de Direito e Religião (IBDR), expondo a cristofobia no Brasil, suas formas de manifestação e como o sistema legal já tem vacinas potentes para esta enfermidade social.
Mesmo assim, a proposição da norma municipal se mostra feliz e oportuna, pois capta o grito da maioria silenciosa no sentido de reafirmar que “a grama é verde”, já que a Constituição Federal estabelece como cláusula pétrea a liberdade religiosa em seu amplo sentido (crer, reunir-se, propagar, organizar-se) e, portanto, impossível de mudar até mesmo por emenda constitucional.
Isso sem falar na farta legislação sobre o tema, demonstrando a religião é tão importante para o povo brasileiro que a discriminação com base nela é crime, bem como as atitudes que ferem o sentimento religioso – a esse respeito, o leitor pode conferir o livro A Laicidade Colaborativa Brasileira: da aurora da civilização à CRFB/88, de Thiago Rafael Vieira e Jean Regina.
Os inimigos dos cristãos, muito mais do que se especializarem no enfretamento direto, estão ensopando as culturas dos países ocidentais de modos sofisticados de anticristianismo
O cristianismo é uma religião perseguida desde seu nascimento; seu fundador recebeu uma pena capital sem ter cometido crime algum. Seus primeiros seguidores também foram condenados à morte, assim como tantos outros ao longo da história. Em tempos recentes, para além dos casos mais graves catalogados pela organização Portas Abertas – que, usando metodologia científica, hoje contabiliza em 400 milhões os cristãos perseguidos no mundo e até ranqueia os 50 países mais hostis –, quem é cristão praticante já foi alvo de algum tipo de intolerância velada ou ostensiva.
Situação antiga e corriqueira, portanto, mas que tem tomado outras formas e proporções, já que os inimigos dos cristãos, muito mais do que se especializarem no enfretamento direto, estão ensopando as culturas dos países ocidentais de modos sofisticados de anticristianismo. Luis Antequera, em Cristofobia. A perseguição dos cristãos do século 21, toma de empréstimo a classificação elaborada pela conferência sobre liberdade religiosa da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) de 2021, segundo a qual a intolerância religiosa, como gênero, tem como espécies, de forma decrescente em termos de gravidade, a perseguição, o assédio e a hostilização.
Segundo o autor, a perseguição religiosa seria aquela que ameaça a vida ou a integridade física, ou mesmo a dignidade humana mais elementar. Assassinatos, ataques diretos a propriedades, negócios e templos, estupros e casamentos forçados exemplificam essa prática. Ela ocorreu com frequência nos regimes comunistas do início e metade do século 20, remanescendo no século 21 na Coreia do Norte e em outros países de governos teocráticos.
O assédio religioso tem a mais variada gama de manifestações especialmente indiretas, mas capazes de segregar cristãos e inviabilizar sua participação na vida social, a exemplo do fechamento de determinadas atividades comerciais, do confinamento de cristãos em guetos e subúrbios, do impedimento de evangelizar os filhos, de exigências administrativas intransponíveis para aberturas de templos, e de imposições de práticas de ritos específicos de uma religião dominante a todos os habitantes de um país.
Mas é a terceira forma que melhor expressa o que hoje enxergamos como cristofobia no Brasil. Falo da hostilização religiosa, que Antequera define como “situação muito especial e típica do momento histórico em que vivemos, especialmente nas sociedades ocidentais (…), produzida tanto por grupos organizados (esquerda radical, lobbies feministas ou gays, lobbies ateístas), como pelo Estado quando endossa os slogans desses grupos de hostilizadores”.
Toda a chamada “Teoria Crítica” e sua “Justiça social” apontam para o anticristianismo – o que, aliás, já era teoria no marxismo clássico e prática comprovada nos países socialistas. Em seu discurso público, embora afirme que o protótipo do “opressor-mor”, na sua tarefa especialmente “decolonial”, se resumiria ao homem branco heterossexual, o “justiceiro social” deixa claro que esse “opressor” também é cristão ou judeu, religiões cuja moralidade é o que mais lhe repugna, tornando-se objeto último de seu esforço de “abolição”.
Fonte: Gazeta do Povo
Fonte: Diário do Brasil