
Um espectro assombra a UnB (Universidade de Brasília): o espectro do comunismo. Ao menos é o que afirmam os membros do Make Unb Free Again (Faça a UnB livre novamente, em português), um movimento empenhado em realizar um exorcismo na instituição.
Para eles, a unidade de ensino está nas mãos da esquerda, generalizada como seguidora da doutrina de Marx e Engels. Por isso, seria papel da direita salvá-la.
A organização tem seu nome inspirado num lema do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, hoje envolvido numa guerra ideológica contra universidades americanas. O republicano faz cortes em financiamentos, persegue estudantes envolvidos em protestos e veta iniciativas de diversidade.
O Make Unb Free Again surgiu no início deste ano e acumula quase 300 membros em seu grupo no WhatsApp, dos quais apenas 100 estudam no campus Darcy Ribeiro, segundo levantamento interno.
Imagem mostra alunos no campus principal da UnB
No troca-troca de mensagens, os participantes ressuscitam ideias do Escola Sem Partido, programa que investe em pautas conservadoras para a educação brasileira, acreditando na existência de uma doutrinação esquerdista.
O líder do movimento é Victor Jansen, 24, que não estuda na UnB, mas é nome conhecido no Distrito Federal. O militante se lançou como pré-candidato mais jovem a uma vaga na Câmara Legislativa da capital em 2022, teve a intenção barrada pela diretoria do Republicanos —partido no qual militava— e agora faz um novo investimento.
À Folha ele diz possuir três metas em sua jornada: garantir a livre manifestação de conservadores no espaço universitário, proibir naquele ambiente intervenções visuais ligadas ao comunismo e acabar com o uso indiscriminado de drogas que afirma existir por lá.
Tudo começou, porém, para defender a honra de Jair Bolsonaro (PL), com quem Jansen declara ter abertura. No dia 14 de março, uma sexta-feira, o Make Unb Free Again entrou na instituição para combater mensagens que, segundo eles, atacavam o ex-presidente. Dentre os alvos deles, estava um desenho dele supostamente morto e pendurado pelos pés com os dizeres “sem anistia”.
Os manifestantes cobriram paredes com tinta branca, apagando qualquer coisa considerada errada por eles. Depois, penduraram bandeiras de Israel e cartazes dizendo “Faça Bolsonaro presidente novamente” e favoráveis à anistia para participantes da tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023.
Tal ato teve efeitos positivos para Jansen. Ele ganhou visibilidade, sendo contatado e apoiado publicamente por políticos, especialmente no Congresso —casos do senador Izalci Lucas e do deputado Hélio Negrão, ambos do PL.
Negrão, por exemplo, criou em parceria com o Make UnB Free Again um projeto de lei (PL 1463/2025) visando aumentar a pena o crime de tráfico de drogas quando praticado no interior ou nas imediações de estabelecimentos de ensino. “E vamos adicionar o uso também”, informa Jansen.
O texto, protocolado em 2 de abril, afirma haver preocupante aumento de casos em que indivíduos, aproveitando-se da condição de estudantes universitários, utilizam as dependências das instituições para a prática criminosa.
A comunidade acadêmica reagiu em defesa da UnB. No primeiro dia letivo no semestre, em 24 de março, centenas de pessoas se aglomeraram num encontro em repúdio ao caso.
Trinta e duas entidades representativas dos estudantes divulgaram uma nota conjunta denunciando uma caça às bruxas na instituição. No texto, encabeçado pelo DCE (Diretório Central dos Estudantes), é destacado que a UnB tem uma longa história de luta e resistência.
“Durante a ditadura militar, estudantes enfrentaram prisões, perseguições e até a morte para defender a democracia. Honrar essa história significa impedir que a universidade seja controlada pelos mesmos grupos que tentaram destruí-la no passado”, declararam.
O Make UnB Free Again se mobilizou novamente. Uma suposta captura de tela do grupo começou a circular. Era uma imagem de chamada para um ato no dia 4. “Porrada contra comunistas!”, estava escrito. “A nossa intenção aqui não é ‘recuperar a UnB’ […] e sim trocar porrada com os vermes”, seguia.
Preocupados, os alunos da universidade iniciaram uma campanha para impedir o ato e denunciaram a ameaça às faculdades, que resolveram suspender as aulas naquela data.
Victor Jansen afirma que o registro é mentiroso e que sua organização é pacífica. Segundo ele, quem estava preparado para usar violência era, na verdade, “a esquerda”. Ele diz ter recebido informações de que os antagonistas estariam se armando com facas e barras de ferro, o que também é negado por representantes da outra parte.
Em resposta, os autointitulados jovens de direita cogitaram levar spray de pimenta. No fim, nada foi necessário. A manifestação mudou de local, passando para a Câmara Legislativa do Distrito Federal, na qual políticos articulam para o movimento ser recebido pelo governo do DF e cobram que a universidade escute as demandas do grupo.
Um novo ato do Make UnB Free Again está sendo marcado para esta segunda-feira (14), no campus Darcy Ribeiro.
Em meio à situação, a reitora da instituição, Rozana Naves, divulgou nota dizendo ter ampliado a equipe de vigilância terceirizada e adequado do sistema de videomonitoramento, com acompanhamento contínuo e redução de pontos cegos nas áreas de circulação.
Afirma ainda estar atuando com os órgãos de segurança pública do Distrito Federal e Polícia Federal, para alinhar estratégias conjuntas de proteção às pessoas.
Já o MEC (Ministério da Educação) declarou defender o papel das universidades federais como espaços de produção e reflexão do conhecimento científico, formação crítica e promoção dos valores democráticos. “Assim, não devem ser aceitos movimentos que atentem contra a integridade das instituições federais de ensino e de suas comunidades acadêmicas”.
No pleno exercício da autonomia que a Constituição garante, as instituições têm legitimidade para adotar as medidas que julgar cabíveis contra os ataques, completa a pasta.
Fonte: Folha de S. Paulo
Fonte: Diário Do Brasil