Conta a tradição que no ano de 998d.C. o Abade Odilo, de Cluny (962-1049), figura importante da ordem religiosa dos beneditinos na França, exigiu que o então chamado “Dia de todas as Almas” (hoje “Dia de Finados“) fosse celebrado em 2 de novembro, em todos os Mosteiros sob sua jurisdição. Estava criada a tradição.
A palavra “FINADOS” deriva do latim “Finis”, que significa “FIM”.
Será mesmo o “nosso” FIM ?
Será que fomos criados para sermos MORTOS ?
Vejamos o que pensa o médico mineiro, cirurgião plástico e biotanatologista Evaldo Alves D’Assumpção (1938) sobre a MORTE :
“Desde nossa concepção estamos num CONSTANTE estado de viver e morrer.
Milhares de nossas células morrem e são repostas continuamente.
Em função de um trauma, doença ou velhice, esta autorregeneração cessa e dizemos que a pessoa “MORREU”.
Na verdade, quem “morreu” foi sua “expressão biológica”, ou “corpo físico”, pois nós, enquanto “INDIVÍDUOS”, somos IMORTAIS.
Deus nos criou para a VIDA e não para a MORTE, que é apenas uma “Passagem”.
Se entendermos isso, certamente perderemos o MEDO da MORTE.’
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Ainda no tema, para nossas reflexões, vale lembrar o monge beneditino alemão Anselm Grün que, em seu livro “50 rituais para a vida”, dá algumas sugestões para passarmos este Dia de Finados :
“1) acenda velas para os que se foram … imagine (com a simbologia) que eles encherão a casa com o seu amor, trarão Luz para a escuridão e Calor;
2) pergunte-se o que eles gostariam de dizer a você ?;
3) que expressões eram típicas deles, e que o ajudaram ?;
4) pense … qual foi a mensagem que eles deixaram para você ?;
5) pense nas características deles;
6) por fim, pense no seu próprio desencarne … que “marcas” eu gostaria de deixar no mundo ? Como eu gostaria de viver hoje, como se este fosse meu último dia aqui ?”
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O jornalista carioca (filho de imigrantes árabes), radialista, escritor, poeta e fundador da LBV (Legião da Boa Vontade) Alziro A. E. D. Zarur, (1914-1979), em sua magistral obra “Poemas da Era Atômica“(1949) escreveu :
“Dois de novembro é um dia, na verdade,
Rico em lições para quem sabe ver:
A maior ilusão é a realidade,
Já ensinava o excelente Paul Gibier.
Os vivos(pseudovivos) levam flores
E lágrimas aos mortos(pseudomortos);
E os mortos se comovem ante as dores
Dos vivos a trilhar caminhos tortos.
Legítimos defuntos, na ignorância
Desses espirituais, magnos assuntos,
Parece que inda estão em plena infância
E vão homenagear falsos defuntos.
Não é preciso ser muito sagaz
Para sentir que a vida tem seus portos:
Um dia, o Cristo disse a um bom rapaz
-Que os mortos enterrem seus mortos- (Mt 8:22).
Amigos, por favor, não suponhais
Que a morte seja o fim de nossa vida;
A vida continua, não jungida
Aos círculos das rotas celestiais.
Os mortos não estão aí, cativos
Nos túmulos que tendes, ante vós:
Os finados, agora, são os vivos;
Finados, mais ou menos, somos nós.”
Essencialmente, o que o poeta queria transmitir é que o NOSSO EXISTIR é uma JORNADA INFINITA … , que NÃO cessa com a MORTE.
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Outro sábio, agora Agostinho de Hipona (354d.C.-430d.C.) escreveu uma oração/simulacro bastante interessante, como se o suposto “MORTO” estivesse conversando conosco :
“A morte não é nada .
Eu somente passei para o outro lado do caminho.
Eu sou eu. Vocês são vocês.
O que eu era para vocês, eu continuarei sendo.
Me dêem o nome que vocês sempre me deram, falem comigo como vocês sempre fizeram.
Vocês continuam vivendo no “mundo das criaturas“, eu estou vivendo no “mundo do Criador“.
Não utilizem um tom solene ou triste, continuem a rir daquilo que nos fazia rir juntos.
Rezem, sorriam, pensem em mim. Rezem por mim.
Que meu nome seja pronunciado como sempre foi, sem ênfase de nenhum tipo. Sem nenhum traço de sombra ou tristeza.
A vida significa tudo o que ela sempre significou.
O fio não foi cortado.
Porque eu estaria fora dos seus pensamentos, agora que estou apenas fora das suas vistas ?
Eu não estou longe, apenas estou do outro lado do Caminho …
Você que aí ficou, siga em frente …
A vida continua, linda e bela como sempre foi.”
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Para os “crentes”, outra meditação parece ser atrativa :
“Esta vida nos foi dada para chegar a Cristo, a morte para encontrá–Lo, a eternidade para possuí–Lo.”
(Padre e Santo chileno Alberto Hurtado, 1901-1952)
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Em síntese, após todas estas ponderações, será que o nome “Dia de FINADOS” é correto ? “Dia dos FALECIDOS” também parece ilógico, e menos apropriado ainda. “FALECIDO” tem origem em “Falecer”, derivado do latim “Fallecere”, com significado de “DEIXAR de EXISTIR”, “PERDER a VIDA”, “MORRER”, “EXPIRAR”). “Dia dos DEFUNTOS” ? Originalmente, a palavra “DEFUNTO” vem do latim “Defunctus” (DE = fora, afastado / FUNCTUS = realizar, efetuar, cumprir); portanto, “DEFUNTO” tem o sentido de “aquele que realizou“, “LEVOU a TERMO“, “CUMPRIU a VIDA“. Também não parece congruente à situação.
Não seriam mais adequados :
– “Diados DESENCARNADOS” , pois “DESENCARNAR” tem sentido de “DEIXAR a CARNE“; – “Diado PASSAMENTO”, com significação de “AÇÃO ou EFEITO de PASSAR” de uma determinada situação/posição, para outra ?Ou, o que parece ser o MELHOR de todos :- “DIAdos VIVOS” ?
Ótima semana !
João Evaristo e família