Por Dimas Ramalho
O Supremo Tribunal Federal há tempos e em consolidada jurisprudência tem confirmado aos Tribunais de Contas a competência para expedir provimentos cautelares, inclusive, sem a prévia citação das partes interessadas.
O reconhecimento de um amplo poder geral de cautela não buscou amparo nas disposições literais do artigo 71 da Constituição da República, que cuida do controle externo da administração pública. Ao contrário, o fundamento das decisões serviu-se da chamada teoria dos “poderes implícitos”, conferindo a prerrogativa de impor medidas de urgência para bloquear bens, suspender processos licitatórios e, também, desconsiderar a personalidade jurídica das empresas contratadas por órgãos jurisdicionados.
Mais recentemente, a partir do julgamento das Suspensões de Segurança nºs 5.306/PI e 5.505/MT, a jurisdição constitucional deferiu às Cortes de Contas a possibilidade de obstar, cautelarmente, os pagamentos às empresas contratadas pela Administração.
Esse panorama jurisprudencial fortaleceu a missão institucional dos organismos de controle externo de modo que renunciar a essas atribuições implicaria no abandono de sua força normativa, com prejuízo à efetividade das competências expressamente enumeradas pelo constituinte.
Nesse contexto, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, em decisão do Pleno de 04 de dezembro de 2024, deliberou sobre o tema e disciplinou o procedimento de concessão de cautelares para suspender pagamentos às contratadas. O Tribunal, sem perder de vista as disposições estabelecidas pelo Supremo, trouxe significativa contribuição ao desenvolvimento da matéria.
Os Conselheiros buscaram uma síntese de equilíbrio entre a expedição de provimento de urgência sem prévio contraditório e, ao mesmo tempo, contemplaram os anseios por uma forma de comunicação antecedente, viabilizando em alguma medida a continuidade da execução contratual.
Conforme o texto publicado no Diário Oficial Eletrônico em 06 de dezembro de 2024, o Relator, ao tomar conhecimento de grave lesão ou risco de dano irreparável determinará, nos termos do art. 71, IX, da Constituição, que cessem os atos irregulares em até 48 horas, sob pena de multa. No mesmo prazo será oportunizada a apresentação de justificativas.
Logo, se não atendida a ordem antecedente e/ou impertinentes eventuais razões de defesa, será submetida ao Pleno a proposta de medida cautelar para impedir a contraprestação pecuniária às contratadas.
Essa solução encampada pela deliberação primou não só pela efetividade da atuação do controle externo quando, de imediato e com a perspectiva de sanção, impõe a regularização das práticas contestadas, como também procurou preservar a continuidade da relação contratual, assegurando a disponibilização de serviços e bens essenciais aos cidadãos.
É preciso reconhecer que a rapidez e a emergência que devem impulsionar a atividade controladora não são um fim em si mesmo. De fato, a preservação do patrimônio público sempre será um imperativo das Cortes de Contas, mas com o objetivo final do bem comum da sociedade a permitir que o Poder Público possa promover os direitos fundamentais inscritos pela própria Constituição da República.
* Dimas Ramalho é Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo