
A situação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), pode ser descrita como um beco sem saída no cenário político em que ele se envolveu. Hoje, Moraes encontra-se em confronto com cerca de 120 milhões de brasileiros — aproximadamente metade da população do país —, que se sentem perseguidos e enxergam em suas decisões não o cumprimento da lei, mas um esforço ideológico para criminalizar opositores da Corte. Esses opositores, em sua maioria, pertencem ao espectro político da direita, o que intensifica a percepção de parcialidade.
Para compreender essa crise, é necessário retroceder no tempo. Desde a nomeação de Luís Roberto Barroso ao STF, em 2013, a Corte assumiu uma postura mais alinhada à esquerda, especialmente em pautas progressistas. Barroso ingressou no tribunal em um momento delicado, quando a esquerda enfrentava forte pressão devido ao julgamento do Mensalão, escândalo de corrupção que marcou o governo petista. Autor da célebre frase “um ponto fora da curva”, ele pareceu chegar com a missão de contrabalançar os ministros favoráveis a punições mais rigorosas contra figuras ligadas a Dilma Rousseff, então presidente, e ao ex-presidente Lula, seu antecessor.
Barroso trouxe novo fôlego aos ministros que defendiam uma guinada ideológica no Brasil por meio do Judiciário, já que o Congresso representava uma barreira quase intransponível para tais mudanças. Essa atuação ativista do STF gerou um embate público com os conservadores, movimento que culminou na ascensão de Jair Bolsonaro. Prometendo combater o que chamava de “ativismo judicial”, Bolsonaro rapidamente se tornou o principal antagonista do avanço progressista liderado pela Corte.
Nesse contexto, Dilma Rousseff caiu por impeachment em 2016, e Michel Temer assumiu a Presidência, trazendo consigo a oportunidade de indicar um ministro ao STF. Para a esquerda, isso representava um risco, já que Temer, de centro-direita, tenderia a escolher alguém alinhado ao seu espectro político. Foi então que surgiu o nome de Alexandre de Moraes, à época Ministro da Justiça e filiado ao PSDB. A esquerda reagiu com veemência, promovendo uma campanha contra sua indicação, enquanto a direita celebrou a indicação, enxergando nele um potencial aliado. Moraes foi rapidamente alçado ao STF.
Enquanto isso, o movimento conservador ganhava força no Brasil, e os ataques ao STF, sobretudo em questões identitárias, tornavam-se cada vez mais intensos. O ápice veio com um ataque à sede da Corte, envolvendo bombas de artifício, liderado pela militante Sara Giromini, conhecida como Sara Winter. Diante disso, o então presidente do STF, Dias Toffoli, decidiu agir. Recorrendo ao artigo 43 do regimento interno da Corte, ele deu início a uma investigação de ofício — sem passar pelo Ministério Público —, mirando os manifestantes que atacavam os ministros quase diariamente. Os alvos principais eram os magistrados alinhados à esquerda, que sofriam insultos e protestos em locais como aeroportos, restaurantes e até no exterior.
Toffoli, então, designou Alexandre de Moraes como uma espécie de “xerife” do STF. Com vasta experiência como secretário de segurança pública, Moraes aceitou o papel, mas exigiu carta branca para agir e o respaldo irrestrito da Corte. Assim começou sua ofensiva. De forma implacável, ele passou a adotar medidas duras contra a direita que combatia os progressistas do STF, garantindo alívio aos ministros antes acuados. No entanto, para isso, Moraes precisou endurecer ainda mais suas decisões, avançando inclusive sobre políticos e parlamentares conservadores.
O resultado foi uma escalada sem precedentes. Hoje, Moraes parece incapaz de recuar ou restaurar a normalidade institucional do STF. Os outros dez ministros, que prometeram respaldar suas ações, encontram-se em uma posição delicada: as decisões da Corte ultrapassaram os limites do razoável. Em uma tentativa de conter o chamado “bolsonarismo”, o governo Lula foi retomado em 2023, mas, longe de apaziguar a situação, isso apenas agravou a crise. O Brasil vive uma ebulição ideológica que extrapolou suas fronteiras, colocando o STF em choque com figuras como Donald Trump, atual presidente dos Estados Unidos, já atacado por Lula durante a campanha americana.
A oposição aproveita o momento para pressionar o Parlamento a retomar o controle institucional e frear o ímpeto do STF, que hoje parece ditar as regras em todos os âmbitos do governo Lula. O que se observa é uma espécie de consórcio entre o Supremo e o Executivo para governar o país, enquanto a sociedade permanece dividida. Ninguém sabe como essa história terminará, mas uma coisa é certa: não será um final feliz.
Por Júnior Melo
Fonte: Diário do Brasil