Por Fernanda Bassette, da Agência Einstein
Caracterizado pelo movimento involuntário dos músculos da boca, especialmente durante o sono, o bruxismo tem trazido prejuízos à qualidade de vida das pessoas, inclusive das crianças. Pesquisa feita na Universidade Ceuma, em São Luís (MA), com crianças entre 7 e 10 anos de idade, constatou a presença do bruxismo noturno em 19,7% delas. O problema foi associado a sonolência diurna, o que pode interferir no desempenho escolar e na realização de outras atividades, e dores nos dentes e no rosto ao acordar.
Segundo a pesquisa, entre as crianças com bruxismo, 17% relataram ter sono ruim, 44% dormiam até 9 horas por noite, 82,2% relataram sentir solonência diurna, 14,9% disseram ter dor de cabeça toda semana e 17,9% disseram sentir dor nos músculos da face ao acordar. Além disso, 42,3% das crianças tinham o hábito de roer as unhas.
Para chegar aos resultados, os pesquisadores avaliaram uma amostra de alunos de uma escola pública e uma particular em São Luís. Foram incluídos meninos e meninas entre 7 e 10 anos, todos saudáveis (sem nenhum transtorno neurológico ou diagnóstico de algum distúrbio do sono, por exemplo). Ao todo, 247 crianças foram analisadas por meio de exame clínico (extra e intraoral), além de receberem um questionário que foi respondido pelos pais, relacionado aos hábitos de sono das crianças e possíveis associações com o bruxismo.
Segundo dados da pesquisa, os alunos foram avaliados em sala de aula por meio de um exame clínico interno da boca, palpação dos músculos da mastigação (masseter e temporal) e também foram avaliados sobre dor na ATM (responsável pelo movimento de abrir e fechar a boca). As crianças que se queixavam de dor de cabeça, por exemplo, mostraram com a mão a localização exata da dor. Os pesquisadores também observaram o desgaste dos dentes das crianças. O diagnóstico de bruxismo do sono seguiu os critérios da Academia Americana de Medicina do Sono.
O diagnóstico e o tratamento
Fabíola Germano de Castro, odontopediatra da equipe de odontologia hospitalar do Hospital Israelita Albert Einstein, explica que o bruxismo é um movimento involuntário tanto de apertar quanto de ranger os dentes. Pode ocorrer durante o sono, mas também enquanto a pessoa está acordada. De acordo com ela, o diagnóstico em crianças normalmente acontece após relato dos pais, que observam que o filho faz barulhos com a boca durante o sono. Fabíola ressalta, entretanto, que o desgaste dos dentes por si só não é um critério de diagnóstico do bruxismo. “Às vezes a criança pode ter refluxo, que causa desgaste no dente. Hábitos alimentares com alimentos muito ácidos também podem provocar desgaste dentário, assim como refrigerantes e sucos artificiais. Ele é apenas um sinal a mais”, afirma a odontopediatra, que ressalta que o padrão ouro para diagnóstico é a polissonografia, embora seja um exame muito caro.
Segundo Fabíola, existem bruxismos sem causa definida (chamados de idiopáticos), mas a presença de problemas comportamentais, estresse emocional, utilização de alguns fármacos (como por exemplo a ritalina) e a obstrução das vias aéreas podem ter um papel importante no desenvolvimento ou agravamento do bruxismo, por isso é tão importante fazer uma boa análise clínica do histórico do paciente (incluindo estilo de vida, hábitos e relações sociais).
“O estresse e a ansiedade têm sido mais estudados porque estão muito comuns em crianças, especialmente após esse período de pandemia. Essas crianças foram expostas a mudanças intensas de rotina, ao isolamento, ansiedade e isso pode estar associado ao aumento de casos de bruxismo nessa faixa etária”, disse. “Além disso, hoje em dia as crianças têm uma agenda muito lotada e isso aumenta o estresse.”
Uma vez diagnosticado, o tratamento do bruxismo é multifatorial com foco no causador do problema, incluindo desde mudanças de hábitos, até massagem, fisioterapia no rosto e laserterapia. “Exemplo: se o fator causador do bruxismo é o estresse, os pais devem procurar um psicólogo. Melhorar o ambiente do sono da criança também é importante. O uso de placas não é indicado para as crianças pequenas, apenas para as crianças com dentes permanentes e bruxismo mais acentuado”, explicou Fabíola.
Para Letícia Bezinelli, também da equipe de odontologia hospitalar do hospital, o fato de 82% das crianças sentirem sonolência diurna não pode ser atribuído apenas ao bruxismo. “Certamente esses 82% de crianças com sonolência não têm apenas o bruxismo. As crianças de uma maneira geral, pós-pandemia, com excesso de eletrônicos e quebra da rotina, acabam dormindo menos, dormindo mais tarde, estão mais agitadas e acabam dormindo pior. O bruxismo acaba sendo mais um fator que precisa ser investigado porque pode impactar negativamente no dia seguinte”, afirmou.
Se o bruxismo não for tratado adequadamente, a criança pode ter problemas com desgaste dentário, sensibilidade, dor de cabeça crônica, dor de ouvido. “Tudo isso pode ser evitado quando diagnosticado corretamente e com mudanças de hábitos”, finalizou Fabíola.