Por Fernanda Bassete, da Agência Einstein
Complicações não tradicionais, incluindo anemia, distúrbios de saúde mental (como estresse e depressão) e pneumonia estão entre as principais causas de internação de pacientes com diabetes tipo 2, em comparação com a população geral, segundo dados de um estudo realizado por pesquisadores australianos. Entre as 10 principais razões de internação desses pacientes, apenas quatro são complicações tradicionais do diabetes. Os resultados foram apresentados na reunião anual da Associação para Estudos do Diabetes, realizada na Suécia, e publicados na “The Lancet”.
Para chegar a esses resultados, os pesquisadores acompanharam mais de 456 mil pacientes com diabetes tipo 2 ao longo de sete anos e compararam as causas de internação com cerca de 19 milhões de australianos — da população com mais de 15 anos. O objetivo era identificar as causas de internação e estimar o risco de hospitalização desses pacientes. As internações por descompensação do diabetes (como distúrbio de glicemia) foram excluídas da amostra.
As complicações foram divididas em 3 categorias pelos cientistas:
Tradicionais, que incluíam doenças cardiovasculares, insuficiência renal, retinopatia, obesidade, infecções do trato urinário, amputações; as emergentes, que incluíam doenças hepáticas, problemas de saúde mental, vários tipos de câncer e infecções menos comuns; e por fim as complicações não comumente conhecidas. De acordo com a pesquisa, apenas quatro complicações tradicionais apareceram na lista de motivos de internações – o que chamou a atenção para a possível identificação de complicações menos associadas ao diabetes.
A pesquisa apontou, por exemplo, que os pacientes diabéticos tipo 2 tinham o dobro de risco de internar por anemia ferropriva (deficiência de ferro) ou distúrbios de saúde mental quando comparados com a população geral. Internação por asma, por exemplo, foi duas vezes mais provável nas mulheres com diabetes tipo 2 do que na população.
Maior controle da doença?
Segundo os pesquisadores, uma das hipóteses que explicam o aparecimento de outras complicações nos pacientes diabéticos refletem o melhor controle da doença, fazendo com que esses pacientes vivam por muito mais tempo e estejam suscetíveis a outros problemas de saúde. Mas ressaltam que o aumento de internações pode sobrecarregar o sistema de saúde.
Os pesquisadores dizem que enquanto as taxas de complicações tradicionais do diabetes tipo 2 caíram consideravelmente nos últimos 20 anos nos países de alta renda (entre elas infarto, acidente vascular cerebral e amputações), outros problemas estão se tornando mais comuns – como câncer, doenças hepáticas e problemas mentais. Na Inglaterra, por exemplo, as complicações clássicas do diabetes tipo 2 foram responsáveis por mais da metade das internações em 2003 e por menos de um terço em 2018.
Para a endocrinologista Adriana Monteiro Fernandes, do Programa de Diabetes do Hospital Israelita Albert Einstein, apesar de o estudo ter acompanhado uma população bastante numerosa, ele foi um estudo observacional que olhou para uma população bastante específica. “O melhor controle da doença certamente vai reduzir a incidência das complicações mais tradicionais e aumentar a expectativa de vida desses pacientes, dando tempo para outros problemas surgirem. Mas não necessariamente essas complicações estão associadas ao fato de o paciente ter diabetes. Fazer essa correlação de causa é muito complexo”, disse a médica. Ela acrescentou, ainda, que em um caso de internação por anemia ferropriva, por exemplo, é difícil estabelecer essa conexão com o diabetes. “Será que a deficiência de ferro desse paciente está relacionada ao diabetes ou por algum outro problema de saúde?”, pergunta. Os autores reconhecem que o estudo foi apenas observacional (analisar dados de internação) e não apontam causa e efeito. Também destacam o fator de incluir apenas pacientes de um país de alta renda, com população basicamente branca, de modo que os resultados não poderiam ser extrapolados para outros países. Ainda assim, Adriana diz que os resultados são interessantes. “Esse foi um primeiro passo para observar essa população. Os resultados são muito importantes para servirem de base para outros estudos que poderão descobrir novas complicações que deverão ser monitoradas mais de perto”, finalizou Adriana.