Por Gustavo Nogy

“Who wants to live forever?” – perguntou cantando Freddie Mercury, que teve uma vida brevíssima, em um dos muitos sucessos do Queen.
Viver para sempre? Respondo como responderia Bartleby, o escrivão, personagem de Herman Melville: “Prefiro não”.

Para sempre é muito tempo. Mas isso não quer dizer que tenho pressa. Já que a vida é uma experiência tão rara, vale a pena prolongar um pouquinho mais, nem que seja por curiosidade, para ver o que acontece.

Cientistas têm feito descobertas significativas no campo da longevidade. Existe a expectativa de que novos medicamentos sejam aprovados nos próximos cinco anos. A “biologia do envelhecimento” está em alta, e intervenções moleculares e genéticas que visam retardar o processo subjacente ao envelhecimento recebem cada vez mais atenção e, claro, dinheiro.

O que se sabe de verdade

A ciência da longevidade é ancorada pela hipótese de que o envelhecimento não é um processo insolúvel. Por muito tempo, a comunidade científica ignorou essa área, resultando em menor financiamento; o investimento em pesquisa sobre o câncer é, em média, 20 vezes maior do que em biologia do envelhecimento.

Mas isso começa a mudar, e o gatilho aconteceu nos anos 1990, quando os cientistas aprenderam que modificar um único gene em um verme nematoide poderia duplicar seu tempo de vida.

Embora essa descoberta não se aplique diretamente aos humanos, ela estabeleceu que o envelhecimento é um processo modificável.

Desde então, pesquisadores identificaram os marcadores do envelhecimento, ou seja, os motores moleculares e celulares por trás do processo de ficar mais velho. Esses motores variam desde danos ao DNA e proteínas até alterações hormonais e perda de eficiência do sistema imunológico.

Conhecer esses motores aumenta as chances de os cientistas descobrirem como desacelerá-los. Já existem dezenas de pistas promissoras obtidas em testes com animais e em laboratório para retardar – talvez reverter – o envelhecimento em humanos.

Um exemplo consiste na ideia da reprogramação epigenética, uma técnica que fez com que células de uma pessoa de 114 anos se tornassem quase indistinguíveis daquelas encontradas nos primeiros momentos da vida.

Intervenções promissoras e desafios de mercado

Múltiplas abordagens estão em estudo, incluindo intervenções nutricionais não farmacêuticas, como a restrição calórica em animais, que poderia prolongar uma vida saudável. Intervenções genéticas e a renovação de células-tronco na medula óssea de camundongos também mostram potencial.

Em termos de medicamentos, uma combinação de rapamicina e acarbose é atualmente uma das líderes, fazendo camundongos viverem 30% a 40% mais. Outra classe de fármacos, os senolíticos, que matam células envelhecidas, prolongou a vida de camundongos, reduziu a incidência de câncer e problemas cardíacos, e melhorou a cognição e a aparência física.

Tratamentos que funcionam em camundongos se mostraram eficazes mesmo quando iniciados na meia-idade avançada. Algumas drogas que retardam o envelhecimento em roedores já são utilizadas com segurança por milhões de pessoas globalmente, o que simplifica a realização de testes clínicos focados em longevidade, caso haja financiamento disponível.

O desenvolvimento de meios para medir a “idade biológica” também acelerará os testes clínicos. Isso permitiria avaliar a eficácia de um tratamento em poucos meses, em vez de esperar anos para observar se os participantes adoecem ou morrem.

Enquanto a pesquisa científica avança em seu ritmo natural, e é um pouco demorado mesmo, tem gente capitalizando o medo da morte e a pressa pela longevidade. O mercado de saúde está saturado de suplementos e dietas vendidos por charlatões que prometem vida saudável e quase imortalidade, sem evidências clínicas adequadas. É o tal negócio: se for pra viver mais tempo como otário… Prefiro não.

Por Gustavo Nogy
Fonte: O Antagonista 

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As mentiras sobre a longevidade. O que é fato e o que é fake na ciência. Pesquisadores buscam tratamentos com potencial para aprovação em breve. Público precisa discernir avanços reais de charlatanismo