Já aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), o primeiro balão intragástrico engolível já começou a ser oferecido por algumas clínicas médicas do país, com a proposta de ser um tratamento menos invasivo contra o excesso de peso quando comparado à cirurgia bariátrica e a outros balões do tipo.

Especialistas em obesidade afirmam, porém, que, embora o produto possa ser considerado uma arma a mais contra a doença, ele não tem indicações nem resultados parecidos com os da bariátrica e deve ser visto apenas como uma das etapas do tratamento.

Caso ele seja usado de forma isolada, sem outras terapias complementares, o risco de recuperação do peso perdido é grande, de acordo com os médicos.

Balões gástricos em si não são novidade no arsenal de terapias contra a obesidade. Esse tipo de produto já é oferecido no Brasil há mais de 15 anos. Pelo método, o balão é inserido e inflado dentro do estômago, no qual permanece por alguns meses. Com uma parte do órgão ocupado pelo dispositivo, o paciente tem maior sensação de saciedade e menos apetite, o que leva ao emagrecimento.

Até agora, os balões existentes no mercado precisavam ser colocados e retirados por meio de uma endoscopia, com o paciente sedado. A novidade do balão deglutível é que, por ser feito de um material menos denso e mais maleável (poliuretano), ele pode ser engolido por meio de uma cápsula dada ao paciente acordado e é expelido naturalmente depois de 16 semanas, por meio da evacuação. O procedimento deve ser acompanhado por um médico.

“Após inflado, o balão tende a ir para o fundo gástrico, levando a uma distensão do órgão, que vai emitir um sinal para o hipotálamo [região do cérebro que regula funções como o apetite] de maior saciedade. Esse mecanismo é bastante evidente em um período de oito a 12 semanas. Depois, ele é compensado por outros mecanismos, e a pessoa volta a ter fome. É um método de emagrecimento, mas, sozinho, não vai conseguir dar um resultado tão relevante”, afirma Eduardo Guimarães Hourneaux de Moura, diretor do serviço de endoscopia gastrointestinal do Hospital das Clínicas e professor doutor da Faculdade Medicina da USP.

A promessa da Allurion, a fabricante do produto, é de perda de 10% a 15% do peso do paciente nos cerca de quatro meses de programa — índice observado em estudos clínicos que testaram a nova tecnologia.

Médicos afirmam que o resultado é possível, mas que o desafio é manter o peso após a eliminação do dispositivo do organismo. No Brasil, o balão é aprovado para pacientes com IMC (índice de massa corporal) a partir de 30.

“A recuperação do peso perdido é a maior crítica ao tratamento com o balão, porque a obesidade é um problema crônico e exige um tratamento contínuo. Muita gente vai se perguntar: mas com os remédios para emagrecer não é a mesma coisa? Sim, mas as medicações são desenvolvidas para serem seguras se forem usadas por vários anos”, diz Marcio Mancini, chefe do grupo de obesidade do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e vice-presidente do Departamento de Obesidade da SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia).

De acordo com os médicos, o paciente até pode colocar um novo balão após a eliminação do primeiro, mas é preciso aguardar pelo menos dois meses para a nova inserção. Além disso, afirmam especialistas, a perda de peso no segundo ou terceiro balão é menor do que no primeiro.

“A obesidade é uma doença crônica, neuroquímica e recidivante. Só é eficaz o tratamento que seja permanente. Usar o balão para tratar a doença por um período curto é negar a essência da doença”, afirma o endocrinologista Bruno Geloneze, membro da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica) e pesquisador da Unicamp.

Ele diz que a nova geração de medicações contra a obesidade, como a semaglutida, tem um porcentual de perda de peso similar ao do balão e é menos invasiva.

Comparação com a bariátrica

Os especialistas dizem ainda que o uso de balão gástrico não pode ser comparado à cirurgia bariátrica.

“A cirurgia é definitiva e ela modifica alguns hormônios que regulam a saciedade, então a pessoa não volta a ter a mesma fome que tinha antes. Não são procedimentos comparáveis”, diz Mancini.

Além disso, a bariátrica, ao alterar o funcionamento de alguns hormônios, provoca a melhora de comorbidades, como o diabetes.

A Allurion afirma que a colocação do dispositivo é apenas uma parte do programa, que inclui o acompanhamento multidisciplinar com apoio de ferramentas tecnológicas. Ao comprar o tratamento em uma clínica credenciada, o paciente recebe uma balança e um smartwatch integrados, que monitoram os seus indicadores ao longo do processo.

“Temos um software com inteligência artificial que monitora o uso do app pelo paciente e dá informações para que a equipe adapte o programa dependendo do engajamento. É um programa em que o paciente não é deixado sozinho”, afirma Benoit Chardon, diretor internacional da Allurion.

A aposta da empresa é que, durante o processo, o paciente, com o apoio de médicos, nutricionistas e psicólogos, adote um estilo de vida mais saudável e consiga manter esses hábitos mesmo após a eliminação do balão.

“O paciente passa por uma consulta médica de avaliação antes, para ver se tem indicação desse tratamento e para ser informado sobre resultados e possíveis complicações. Também passa por um nutricionista, um psicólogo e um coach de saúde, que vai cuidar do dia a dia daquele paciente durante o processo de emagrecimento”, afirma Eduardo Grecco, endoscopista bariátrico do Instituto Endovitta, a primeira clínica brasileira a ser credenciada pela Allurion para oferecer o tratamento com o balão deglutível.

Ele afirma que a principal vantagem do tratamento é a possibilidade de ter uma perda de peso mais rápida em comparação com as medicações, sem a necessidade de procedimentos como a endoscopia para a colocação do balão. “Ele traz um resultado de curto prazo, que estimula o paciente a se manter no tratamento”, afirma.

Para os demais especialistas ouvidos pelo Estadão, a estratégia pode ser válida se o paciente, de fato, mantiver o tratamento posteriormente.

“É um tratamento temporário, mas pode servir para acolher o paciente e dar consciência a ele sobre a sua doença. Pode parecer óbvio, mas somente 7% das pessoas com obesidade fazem tratamento no Brasil. Então, o balão tem seu espaço para trazer o paciente para a linha de cuidado, mas ele precisa de uma complementação”, afirma Ricardo Cohen, coordenador de Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.

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