O hábito de mexer na tela pode ser considerado uma doença? Ou é algo natural? O Olhar Digital te ajuda a esclarecer essas dúvidas.
Você já parou para pensar quantas vezes no dia você pega o seu celular? Consciente e inconscientemente. Às vezes para ver a hora, ou fazer uma ligação, ou mandar uma mensagem importante. Mas, na maioria das vezes, as pessoas começam a mexer no aparelho numa espécie de impulso. E a ciência explica o porquê.
Éilish Duke, professora de Psicologia na Universidade Leeds Beckett, no Reino Unido, pediu às pessoas que dissessem de quanto em quanto tempo elas verificavam seus smartphones.
Em média, os participantes do estudo falaram em 18 minutos. A pesquisadora, então, resolveu filmá-los – e a realidade foi muito diferente. Alguns não conseguiam ficar longe dos celulares por menos de 5 ou 10 minutos.
Seria isso uma doença? Estamos viciados nas telinhas? As big techs conseguiram finalmente nos controlar? Calma! Não há motivo para pânico (nem para criar teorias da conspiração). Esse comportamento tem uma explicação científica e é natural, segundo os especialistas. Isso não significa, porém, que não precisamos tomar alguns cuidados.
O cérebro explica tudo
A professora Duke explica que a primeira coisa que precisamos entender é que o impulso de pegar o celular e ligar a tela é automático. E nós não temos consciência disso porque construímos esse hábito ao longo do tempo. É como verificar se fechamos a porta ao sair de casa, ou fechar a porta ao ir ao banheiro. Nós nos condicionamos a fazer isso, percebendo ou não.
Outra professora, Ariane Ling, do Departamento de Psiquiatria do NYU Langone Health, nos EUA, acrescenta que a curiosidade faz parte da natureza humana. Segundo ela, nós estamos biologicamente programados para querer saber o que está acontecendo ao nosso redor. É por isso que nos interessamos por notícias ou, por exemplo, paramos para olhar quando há um acidente na estrada. Nossa espécie, aliás, só sobreviveu por causa disso. Faz parte da nossa evolução natural.
Um último ponto diz respeito ao funcionamento do nosso cérebro: ele busca naturalmente ser recompensado. Os cientistas chamam isso de sistema ou circuito de recompensa do cérebro. Temos alguns centros neurais que reagem ao prazer – ao sexo, ao álcool, às drogas, a ganhar dinheiro fácil. E a tendência é sempre buscar mais.
Entendeu essas 3 características biológicas? Pois é aí que entra o fator externo: o smartphone entrega tudo isso. Criamos o hábito de mexer no celular; a internet e as redes sociais nos alimentam com informações que nos interessam; e essas informações geram prazer para o nosso cérebro – que é o que ele quer.
Mas isso não está fazendo mal para as pessoas?
- Sim, existem alguns perigos nesse hábito, mas eles não são físicos necessariamente.
- Em primeiro lugar, é preciso saber que a dependência do celular não consta no manual de diagnóstico psiquiátrico.
- Portanto, não existem critérios estabelecidos para diferenciar o uso saudável do uso problemático – e, consequentemente, da dependência.
- Mesmo sem ser uma “doença” catalogada, é fato que o uso exagerado pode atrapalhar a maneira com a qual a pessoa se relaciona com a sociedade e o mundo.
- Ao mesmo tempo que algumas partes do nosso cérebro buscam o prazer, o córtex pré-frontal luta contra esses impulsos.
- É ele que te fala: ‘larga esse celular e vai limpar a casa’, ou ainda ‘levanta do sofá e vai fazer um exercício (vai fazer bem para a sua saúde).
- Deve haver um equilíbrio entre essas duas funções cerebrais – o problema é que a parte lógica vem perdendo bastante para a parte impulsiva.
- E isso é mais comum em crianças, que ainda não desenvolveram completamente o córtex pré-frontal.
- Nesse caso, elas podem entrar no que os psicólogos chamam de estado de fluxo.
- É quando perdemos a noção do tempo e passamos duas horas seguidas ou mais vendo vídeos de gatinho ou de academia ou do Palmeiras (pois é, o algoritmo me conhece…)
- Às vezes nós não queremos ficar esse tempo todo no celular, poderíamos estar fazendo algo mais útil, mas não percebemos o tempo passando.
- Isso já deve ter acontecido com você também – e não apenas com as crianças.
O que fazer para evitar o vício
As especialistas recomendam algumas atitudes simples, que devemos tornar rotina, assim como fechar a porta e mexer no celular.
A primeira delas é reservar momentos do dia nos quais você ficará longe das telas. Evite levar o aparelho à mesa durante as refeições e vá para a academia ou fazer uma caminhada e deixe o smartphone em casa.
Isso vai ajudar você a prestar atenção ao que está ao seu redor, exercitar outras funções do cérebro e ter consciência de como você se sente ao deixar o telefone para trás.
Outra dica é interagir mais com o mundo real. O celular acaba sendo uma espécie de porto seguro, pois ele te entrega tudo o que precisa no mesmo lugar. Mas em vez de olhar a hora nele, comece a usar relógio de pulso ou pergunte a outra pessoa na rua. Até porque, depois de olhar a hora, você quase sempre vai acabar mexendo em outras coisas na tela.
Por fim, a última dica é: controle os seus impulsos. Tente prestar atenção nos momentos em que está rolando a tela do celular e se questione: é isso mesmo que eu queria fazer agora? Eu não tenho algo mais útil e urgente para fazer?
Pode parecer difícil no começo, mas é possível, sim, condicionar o seu cérebro para isso. E haverá um belo ganho de qualidade de vida.
As informações são da BBC.
Por Bob Furuya, editado por Lucas Soares