A médica otorrinolaringologista Vera Moron Rodrigues fala sobre a doença que se tornou mais comum durante a pandemia
O equilíbrio do corpo humano é originado no ouvido e percorre um complexo caminho até o cérebro. Nele, estão envolvidas estruturas como o labirinto (localizado na orelha interna), o sistema nervoso central, além dos sentidos da visão e do tato, incluindo articulações, tendões e músculos.
A labirintopatia é uma doença caracterizada principalmente por afetar o equilíbrio do paciente quando alguma parte desse sistema está afetado. Dessa forma, pode ser classificada como periférica (com origem no labirinto) ou central (com origem do sistema nervoso central).
De acordo com a médica otorrinolaringologista Vera Moron Rodrigues, as labirintopatias acometem muitas pessoas, em especial acima dos 60 anos. Contudo, durante o período de pandemia, as queixas nos consultórios têm aumentando principalmente entre o público mais jovem. Confira a seguir algumas diferenças entre causas, tipos e tratamentos disponíveis para estas desordens do equilíbrio.
ORIGENS
Apesar de serem chamadas de labirintopatias, muitas vezes a doença pode não ser originada diretamente no labirinto. “Caberá ao médico buscar a origem dessas queixas para oferecer um diagnóstico preciso e tratar o fator causal”, explica a especialista.
A origem da labirintite pode ser atribuída a infecções virais, quando são chamadas de “labirintites verdadeiras”, com alterações específicas do ouvido interno, como no caso da vertigem postural benigna.
Entre causas não labirínticas para as labirintopatias estão as tonturas e vertigens originadas pela região cerebral, como, por exemplo, as advindas de uma diminuição do fluxo sanguíneo e do oxigênio para o cérebro. “Isso pode ocorrer por estreitamento de vasos ou pinçamento de vasos no pescoço, como uma osteoartrite cervical, que é bem comum na pessoa idosa. Há ainda as causas metabólicas, como diabetes, anemia, alterações tireoidianas, entre outras”, destaca a médica.
Os fatores psicológicos podem estar envolvidos nas crises. “Quando o paciente passa por um trauma, situações de ansiedade geradas pelo trabalho, família ou mesmo uma fase pessoal, isso pode desencadear crises. Como dissemos, é um sistema integrado entre o labirinto e o sistema cerebral. Então um fator emocional muito pode interferir nesse quadro. Neste caso, o contexto que estamos vivendo hoje, com o ritmo de vida acelerado e agora com as inseguranças e medos advindos da pandemia, episódios de labirintites são favorecidos, destaca a especialista.
A médica chama atenção para não confundir causas e sintomas. “Substâncias como o café e o chocolate, por exemplo, podem incentivar uma crise quando temos doenças metabólicas envolvidas, o que é bastante comum na labirintopatia, principalmente na Doença de Ménière. Nela há um aumento da pressão do labirinto pelo aumento do líquido, chamada de hidropsia endolinfática. As alterações de glicemia pioram essa pressão do labirinto, agravando a sensação de tontura. Por isso a recomendação médica é reduzir o consumo de carboidratos em geral e a cafeína também, pois ela age como estimulante”.
Para diferenciar a origem dos sintomas, o otorrino realiza exames como o otoneurológico, que pesquisa toda a função do labirinto, possibilitando diferenciar se a causa é periférica ou central.
TIPOS DE CRISES
A labirintite pode ser aguda, episódica ou crônica. O quadro agudo demanda é geralmente o que gera a procura do paciente pelo pronto-socorro, demandando internação e medicação injetável.
No caso das crises episódicas, há eventos cíclicos. Há uma crise com melhora posterior. Pode se passar até mesmo anos antes de outra crise, mas ela volta a acontecer.
E no caso crônico, o paciente não consegue obter uma melhora. “Há geralmente uma perda auditiva importante associada, muitas vezes com uma hipofunção vestibular do labirinto, o que gera um quadro mais complicado e demanda um acompanhamento mais frequente”.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
O tratamento, em todos os casos, costuma ser bastante personalizado, com apoio multidisciplinar, envolvendo diversos profissionais e aspectos diagnósticos:
Vertigem postural benigna
Diagnóstico da grande maioria dos casos, é normalmente relatado pelo paciente que estava dormindo, levantou e sentiu que o quarto estava rodando, com tontura e possivelmente vômito. O tratamento envolve a reabilitação labiríntica, que utiliza algumas manobras específicas para colocar os cristais o labirinto na posição correta. “O paciente busca o pronto-socorro e se o médico que o atender conseguir fazer a manobra, ele consegue sair da crise imediatamente, sem necessidade de internação ou medicação. Também é possível realizar as manobras com o fonoaudiólogo ou fisioterapeuta especializado”, acrescenta a especialista.
TONTURA, VERTIGEM E CINETOSE
Entre os sintomas mais característicos das labirintopatias estão a tontura e a vertigem.
“A tontura é uma sensação do desequilíbrio corporal e 85% dos casos tem origem labiríntica. Pode haver uma sensação de flutuação, afundamento, oscilação, instabilidade corporal, cabeça oca ou pesada e atordoamento, muitas vezes também provocando desvio de marcha”, esclarece a médica.
“Já a vertigem é uma sensação do indivíduo estar rodando ou o ambiente estar rodando em torno dele. Nesse caso, 85% das vezes a sensação também tem origem no labirinto”, acrescenta.
Elas podem surgir ainda associadas a outros sintomas, como náusea, sensação de ouvido tapado, zumbidos e perdas auditivas.
A tontura e a vertigem das labirintopatias, no entanto, não devem ser confundidas com a cinetose – um desconforto que algumas pessoas têm ao andar de barco, ônibus, carro e em brinquedos como roda gigante e montanha russa. “Os sintomas podem se confundir e por isso é importante realizar o exame otoneurológico para verificar, inclusive, se a cinetose e a labirintopatia coexistem. É preciso investigar as causas e muitas vezes podemos chegar à conclusão de que é apenas uma sensibilidade maior aos movimentos. A conduta nesse caso é evitar se expor a essas situações ou utilizar medicação adequada para reduzir os sintomas”.
Outras causas
Quando há alterações emocionais, indica-se o acompanhamento do psicólogo ou psiquiatra; já no caso de metabólicas, o acompanhamento pelo endocrinologista é indicado para avaliar alterações como colesterol, triglicérides, diabetes e tireoide. “É bastante comum descobrirmos casos de hipotireoidismo derivados de casos de tontura, por exemplo”, cita a profissional.
Quando o paciente tem alterações de equilíbrio, fala e/ou visão, por exemplo, há espaço para se suspeitar de um processo neurológico. “Nestes casos é possível solicitar a ressonância e, quando necessário, encaminhar ao neurologista”.
Em pessoas mais jovens, o diagnóstico costuma abordar fatores emocionais ou até mesmo alterações no sistema nervoso central. Neste caso, as solicitações de ressonância se tornam mais frequentes para eliminar as suspeitas de ocorrências de um tumor, por exemplo.
Outro diagnóstico bastante frequente nos jovens está relacionado à coluna cervical. “Durante a pandemia nos deparamos mais frequentemente com problemas posturais com efeitos importantes para a coluna, tensão na musculatura cervical e consequentes alterações de equilíbrio”.
Neste caso são frequentes também os zumbidos. “Esse sintoma costuma estar bastante relacionado com a tensão cervical. Muitas vezes a queixa principal do paciente é o zumbido e ao examiná-lo percebemos que está numa crise de labirintopatia, mesmo que não sinta a tontura. E coincidentemente percebemos um aumento de casos neste ano, provavelmente desencadeados por posturas incorretas em home office, além de tensões e ansiedade da situação que estamos vivendo”.
O consumo de medicações consideradas ototóxicas também deve ser avaliado, como certos tipos de antibiótico que podem lesionar o nervo auditivo. “Atualmente algumas classes de antibióticos só são prescritas em caso de última necessidade para evitar exatamente esta ototoxicicidade”, pontua a médica.
No tratamento, a depender da causa, é possível lançar mão de antivertiginosos e antidepressivos, principalmente em jovens, para superar essa fase. Se for relacionada à coluna cervical, o acompanhamento pelo fisioterapeuta, com indicação de atividades como RPG, pilates e natação são bastante frequentes.
Vera Moron Rodrigues (CRM 38792) é otorrinolaringologista e médica de sono. O consultório está situado na Rua José Bertonha, 163, Jardim Tangará, telefone (14) 3433-1660. A Clínica do Sono fica na Rua 21 de Abril, 295, Jardim Maria Isabel, fone (14) 3454-2724.