O Serviço de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista da Santa Casa de Marília, em seu atual modelo de gestão, aproxima-se em 2020 de quinze anos de funcionamento, ultrapassando a marca de 58.400 procedimentos realizados em pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) e também da rede privada de Marília e região, abrangendo 62 municípios do Departamento Regional de Saúde IX.

Nesse período consolidou o atendimento de emergência para o tratamento do infarto agudo do miocárdio, implementando os cuidados 24 horas/dia, 7 dias/semana, alcançando indicadores de qualidade superponíveis aos de grandes centros de referência cardiológica.

Somado a isso, avançou no tratamento das cardiopatias estruturais, oferecendo procedimentos de alta complexidade, minimamente invasivos, tais como implante percutâneo de bioprótese para a correção da estenose aórtica e de defeitos cardíacos congênitos, procedimentos antes realizados somente com procedimento cirúrgico convencional. Para tanto, conta com a estrutura completa de duas salas de Hemodinâmica, sendo a última dotada de tecnologia alemã, em funcionamento desde novembro de 2016.  

No entanto, em 2020 foi assolada com um evento sem precedentes para sua história, a pandemia provocada pelo COVID-19. Trágica pelo número de vidas retiradas de nosso convívio, indiferente quanto à região geográfica envolvida, classe social, agressiva contra grupos de risco caracterizados por idade avançada e múltiplas comorbidades, mas por vezes não respeitando a ausência destas, certamente cursará com profundas transformações no modo de vida vigente até o seu aparecimento.

Desde a detecção do caso índice no Brasil, na capital paulista, em fevereiro de 2020, o serviço de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista da Santa Casa de Marília implementou medidas profiláticas e de cuidados à saúde para frear ou minimizar os danos decorrentes da síndrome respiratória aguda grave, manifestação mais grave, embora não exclusiva, da doença. Dentre essas destacou-se a recomendação de o paciente permanecer em domicílio mediante sintomatologia leve. Compreensivelmente motivados pelo receio de contaminação, muitos pacientes portadores de doenças crônicas, notadamente as cardiovasculares, limitavam-se a buscar auxílio médico especializado em circunstâncias avançadas de agravamento de suas condições, culminando muitas vezes com um desfecho adverso grave ou fatal, como infarto agudo do miocárdio ou acidente vascular encefálico. 

Observa-se no Brasil comportamento similar ao constatado em outros países em nível global: um aumento da mortalidade domiciliar por eventos cardiovasculares e uma evolução mais grave e complexa dos pacientes admitidos nos hospitais, decorrentes do retardo na busca de atendimento especializado. Nos meses de abril e maio deste ano houve uma queda expressiva de 30% no número de procedimentos cardíacos invasivos realizados em caráter de urgência ou emergência. Para fins de comparação, foram realizados 141 cateterismos e/ou angioplastias nesses meses pelo Serviço de Hemodinâmica da Santa Casa de Marília no ano de 2019, comparados a 100 casos no mesmo período em 2020. Em contrapartida, a partir de junho, evidenciou-se um aumento nas ocorrências de atendimento hospitalar aos pacientes infartados, possivelmente refletindo a falta de assistência ambulatorial verificada nos meses inicias da pandemia.

Adotando os cuidados necessários para o adequado atendimento aos pacientes que necessitem de procedimentos coronários invasivos, pautados pela segurança de todos aqueles envolvidos nesse processo, o Serviço de Hemodinâmica da Santa Casa de Marília manteve-se plenamente ativo no transcorrer da pandemia, com escala integral de funcionamento. Além disso, usando o momento crítico que vivenciamos como estímulo para implementação de melhorias, avançou em protocolos de procedimentos terapêuticos ambulatoriais, visando maior comodidade e conforto aos usuários do serviço. Assim, dentro de critérios rigorosos de segurança, passou a realizar angioplastias coronarianas (implante de stent) e procedimentos estruturais de menor complexidade, tais como fechamento percutâneo de defeitos estruturais congênitos (comunicação interatrial, forame oval patente), com alta hospitalar no mesmo dia da internação.

Que a humanidade possa superar o quanto antes a crise de saúde e econômica, cujos reflexos ainda se farão sentir, provocadas pela pandemia do COVID-19, extraindo importantes lições a partir do sofrimento e dificuldades impostas de forma tão crua e dura em nosso cotidiano, habituando-nos, com sabedoria e altruísmo, ao novo normal dos anos subsequentes.    

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Atenção à saúde cardiovascular em tempos de pandemia