A Receita Federal abre nesta quinta-feira (25) a fase de propostas de valor para uma nova edição de seus leilões de mercadorias apreendidas ou abandonadas. E, desta vez, há mais de 120 veículos disponíveis entre os lotes.
Há carros, caminhões e ônibus com preços bem abaixo da tabela, incluindo SUVs seminovos e utilitários bem rodados.
Usualmente, esses carros despertam interesse em quem tem desmanches legalizados, ou de empresários de lojas de carros. Mas o consumidor final também pode tentar levar um deles para casa.
Como em qualquer leilão, é preciso analisar minuciosamente cada item para saber qual faz sentido na sua garagem. Para te ajudar, o g1 reuniu as principais dicas e as opiniões de especialistas para que você tome a melhor decisão.
Origem dos produtos
Existem dois tipos de leilões: os particulares e os públicos. No caso do Leilão da Receita, são enviadas propostas de valor, que são ordenadas para o dia do pregão. Quem dá a melhor oferta, fica na frente na fila e pode cobrir os lances dos demais.
A primeira pergunta que o consumidor pode se fazer é: de onde vêm esses veículos?
O leilão da Receita Federal oferta modelos que foram apreendidos ou abandonados. De acordo com Otávio Massa, advogado tributarista, esses veículos têm origem em operações de fiscalização aduaneira e foram retidos por questões legais, fiscais ou por abandono em recintos alfandegados.
Existem também os carros inservíveis de órgãos públicos, como os que já não têm mais utilidade para o propósito governamental e são vendidos para reutilização ou como sucata.
“Os veículos são vendidos no estado em que se encontram, sem garantias quanto ao seu funcionamento ou condições, e o arrematante assume todos os riscos”, explica o tributarista.
Em meio aos riscos, há excelentes preços. Exemplo disso é o Jeep Compass Longitude 2018 branco desse atual pregão, que tem preço mínimo de R$ 21.815 e, a julgar pelas imagens e descritivo no site do fisco, está em plenas condições de uso.
Para se ter ideia, o mesmo veículo poderia ser vendido por R$ 94.637, segundo preço da Tabela Fipe. O benefício parece grande, sobretudo com essa diferença de mais de R$ 70 mil. Porém, existe um passo a passo para verificar o estado do carro, que vamos falar adiante.
Diferentemente das revendas oficiais ou multimarca, não é oferecida uma garantia para o produto. É nesse momento que o consumidor tem que ligar o alerta: produtos de leilões particulares podem ter garantia para apenas alguns itens. Os públicos, por sua vez, não têm garantia.
Por isso, é importante checar se é possível fazer uma vistoria presencial no modelo antes de pensar no primeiro lance. Nesta edição do Leilão da Receita, as visitas são permitidas, mas demandam agendamento prévio.
Luciana Félix, que é especialista em mecânica de automóveis e gestora da Na Oficina em Belo Horizonte, lembra ainda que a burocracia pode ser um grande empecilho para o uso do item leiloado. Um exemplo que ela cita é o de um carro aprendido, que pode ter problemas na documentação.
“Esses carros já vêm com burocracias devido ao seu histórico. (…) Às vezes, são carros que necessitam de uma assistência jurídica. Você tem que contratar um advogado para fazer toda a baixa dessa papelada”, alega a especialista.
Leilões particulares
No caso de leilões privados, a origem dos carros pode ser bastante distinta do que os promovidos pela Receita Federal.
De acordo com a especialista em mecânica automotiva Luciana Félix a maioria dos pregões particulares oferece carros de seguradoras (geralmente de sinistros, com perdas totais ou parciais), de locadoras, e de empresas com pequena frota, que colocam a antiga para leilão quando precisam fazer a substituição.
Simplificando o conceito:
- Leilões particulares: frotas de empresas, devoluções de leasing, de seguradoras
- Leilões da Receita Federal: apreendidos, confiscados ou abandonados.
Tipo de compra
Segundo Ronaldo Fernandes, especialista em Leilões da SUIV, empresa que possui um banco de dados de peças automotivas, é fundamental entender que existem duas maneiras de adquirir automóveis ofertados em leilões: para restaurar ou utilização; e aqueles voltados exclusivamente para empresas de desmanche legal.
“Não há um tipo específico de veículos que vai a leilão, mas é muito importante verificar qual o tipo de venda que está sendo oferecida para o veículo de interesse, pois alguns veículos poderão circular normalmente e outros servirão somente para desmonte ou reciclagem devido à sua origem”, afirma Fernandes.
Nos casos em que os carros são vendidos para desmanches, a origem deles se dá por conta do tamanho do sinistro. “Dependendo do tamanho do sinistro, o automóvel só poderá ser vendido como sucata, ou seja, sem documentação para rodar novamente”, afirma Fernandes.
Critérios para venda
Segundo o advogado tributarista Otávio Massa, os critérios para que um carro vá a leilão incluem:
- Valor comercial: veículos com valor residual significativo que justifique a venda.
- Condição recuperável: mesmo que parcialmente danificados, se ainda tiverem peças reutilizáveis ou puderem ser reparados.
- Procedimento legal: veículos apreendidos ou abandonados que legalmente devem ser vendidos em leilão público.
- Resumindo, o que define se um veículo vai ser leiloado é o quanto ele ainda pode despertar o interesse financeiro de novos compradores.
Thiago da Mata, CEO da plataforma Kwara, afirma que é feita uma avaliação prévia para determinar o valor a ser cobrado.
“Normalmente, ativos que possuem débitos superiores ao seu valor de mercado são considerados sucata e vão para descarte. Da mesma forma, veículos cujo estado de conservação seja muito crítico podem ter o mesmo destino para que possam ser aproveitadas as peças”, argumenta.
Otávio Massa corrobora com a visão de da Mata ao afirmar que “não há uma porcentagem mínima específica estabelecida por lei, mas o critério principal é se o veículo tem valor comercial residual. Veículos sem valor ou severamente danificados podem ser descartados”.
Carros, caminhões, ônibus e outros modelos destinados a desmanche têm seus respectivos números de chassis cancelados. É como se o automóvel deixasse de existir.
Prudência e dinheiro no bolso
De acordo com Thiago da Mata, da Kwara, inspecionar o veículo é de suma importância. Afinal, os carros podem ter distintos estados de conservação, o que tem que entrar na lista de preocupações de quem participa de um pregão.
“[Os veículos] podem tanto estar em bom estado de conservação, como também é possível que tenham ficado em pátio público durante um período de tempo importante”, afirma.
A maior parte dos carros ofertados no atual leilão da Receita Federal possuem marcas provocadas pelo período em que ficaram expostos ao clima: pintura queimada, oxidação da lataria, manchas provocadas pela incidência solar. E esses reparos também precisam entrar no planejamento financeiro do comprador.
Como dito antes, a situação legal do carro é outro fator decisório. Considerando o Smart Fortwo da imagem abaixo, repare no que está no descritivo do produto: “veículo sem registro no Renavam”. Por se tratar de um carro apreendido, de origem argentina. O Registro Nacional de Veículos Automotores (Renavam) é um documento brasileiro.
Portanto, é preciso ter conhecimento do tempo e dinheiro que deverão ser investidos para regularizar o produto, além de todos os custos que envolvem um automóvel, como IPVA, licenciamento e seguro.
Idealmente, a inspeção deve ser feita de forma presencial, segundo os especialistas consultados nesta reportagem.
Ao verificar um carro, por exemplo, é preciso verificar tudo: bancos, painéis de porta, console central, volante, conferir os equipamentos, a quilometragem, ligar o carro, abrir o capô, checar a existência de bateria de 12V e, se possível, levar um especialista ou mecânico de confiança para checar as partes técnicas e prever possíveis custos extras com manutenção.
No caso do Jeep Compass que mostramos no começo da reportagem, o painel de instrumentos indica que ele percorreu 46.513 quilômetros. Levando em conta que o brasileiro costuma rodar, em média, 15 mil km por ano, o SUV deveria ter aproximadamente 90 mil km, uma vez que já faz seis anos que ele foi fabricado.
Luciana Félix, que é especialista em manutenção, diz que o consumidor precisa ver até o histórico de manutenção, se possível. E documentar tudo com fotos.
“Comprar carros em leilão é tipo um investimento de risco, você pode se dar muito bem ou muito mal, pois você não poderá andar com o carro para saber como está o seu motor ou câmbio, pois todos os veículos estão lacrados”, argumenta a proprietária da Na Oficina.
É importante ressaltar que essa é a mesma verificação que se faz ao comprar um automóvel usado, seja presencial ou via marketplace: deve ser feita uma avaliação técnica, além de checagem da quilometragem rodada e documentação do ativo.
“Importante que seja feita a verificação de débitos ou algum tipo de bloqueio para venda, pois a responsabilidade por estes pagamentos pode ser diferente de leilão para leilão. Estas informações devem estar presentes no Edital, que deve ser lido com atenção antes que qualquer lance seja dado”, alerta Thiago da Mata, da Kwara.
Em carros da Receita Federal, é comum encontrar a informação de algum defeito ou peça faltando no descritivo, como na imagem abaixo: o VW SpaceFox, que tem lance mínimo de R$ 4 mil, é oferecido sem os bancos do passageiro e traseiro.
Quando a compra é feita pela internet e não existe a possibilidade de visitar o produto, é indicado solicitar uma vídeo-chamada para fazer essa inspeção. Não é o ideal, mas já ajuda a verificar o estado do carro, mesmo que seja à distância.
O que verificar:
- Documentação: incongruências jurídicas;
- Custos para regularização;
- Estado de conservação do carro;
- Custos para restauro;
- Condições de compra;
- Inspeção mecânica e de equipamentos.
Assim, se você vai participar de um leilão pela primeira vez, atente-se para os seguintes passos.
Estude: leia o edital e entenda as regras do leilão;
Verifique a procedência: se certifique que o veículo não tem pendências legais;
Defina um orçamento: estabeleça um limite máximo de gastos;
Inspecione: se possível, veja o veículo pessoalmente ou solicite um relatório detalhado;
Experiência: participe de leilões menores para entender a lógica de funcionamento.
Revista D Marília / Fonte:G1