Acompanhamos diariamente, esperançosos, as notícias sobre o desenvolvimento e os testes de vacinas para a COVID-19. Quando for comprovada a sua eficácia, este será talvez um dos bens de maior valor percebido por todos no mundo, independente do país de origem ou pelo fato de estar ou não no grupo de risco. Mas enquanto o debate está aquecido no esforço mundial para produzir a vacina, um outro desafio silencioso nos assombra, principalmente em um país continental como o Brasil: a capacidade de distribuição segura das vacinas para todas as regiões. E neste processo, a chamada internet das coisas, ou IoT, como na sigla em inglês, poderá ser a única solução.

Muita gente não sabe, mas nos últimos vinte anos, o setor de logística tem experimentado uma revolução tecnológica. Por meio de um pequeno computador, sensores e outros equipamentos conectados a veículos e cargas, podemos monitorar em tempo real os mais diversos indicadores para garantir a segurança, a qualidade e a prevenção contra fraudes nos transportes. Essa tecnologia baseada na internet das coisas proporciona uma inteligência artificial a objetos que nunca antes imaginávamos que poderiam estar conectados, como caminhões, equipamentos de refrigeração e, por que não, lotes de vacinas para a COVID-19?      

A vacina, imaginamos todos, será feita de compostos químicos e biológicos extremamente sensíveis. Ela deverá ser mantida a uma determinada temperatura, terá a quantidade certa de iluminação e umidade às quais poderá ser exposta e, ainda, terá uma tolerância limitada de trepidação que os veículos que farão seu transporte poderão sofrer. Agora, imaginem o tamanho da cadeia logística para fazer com que ela chegue até os locais mais afastados do país. Seja a origem do Instituto Butantã em São Paulo, da Fiocruz no Rio de Janeiro, da Universidade de Oxford, ou até mesmo da China, não importa quem obtiver sucesso na produção, certamente o caminho até alguns municípios vai demandar avião, balsa e até estradas de terra, tudo isso nas mais variadas condições climáticas.

Temos ainda outro agravante. Se para comprar aparelhos respiradores, já temos incontáveis denúncias de fraude, certamente haverá quadrilhas de olho nas cargas de vacina para a COVID-19. As soluções de IoT podem ajudar na prevenção contra roubos, com geolocalização, sistemas antifurto e protocolos de acionamento automático das autoridades, entre outras muitas estratégias disponíveis. E o Brasil, enquanto epicentro da pandemia, e um dos campeões em roubos de cargas no mundo, certamente será um case de ousadia do crime organizado para roubar, revender e até fraudar lotes de vacina. Então, fica claro que muita coisa pode dar errado no caminho.

Só o que não pode dar errado é a eficácia da vacina por ocorrência de incidentes que acontecem entre o laboratório e o posto de saúde. Imaginem a tragédia humana se as pessoas acreditarem estar imunizadas, deixarem as máscaras de lado, abandonarem o isolamento social e as demais medidas, quando na verdade a vacina foi adulterada ou perdeu sua qualidade porque foi exposta, por exemplo, a uma temperatura excessiva.

O ponto chave é que nós sabemos que esse tipo de falha já acontece com muitos remédios, alimentos, equipamentos, enfim, diversos insumos que são distribuídos. Mas nós fechamos os olhos pois os incidentes são geralmente isolados, sem grande repercussão ou difíceis de rastrear. No caso de uma vacina, para uma doença letal, em meio a uma pandemia, se deixarmos de empregar uma tecnologia que está ali, à nossa disposição, para garantir a segurança das pessoas, estaremos ultrapassando os limites da negligência à vida humana. Fato é que, caso seja empregado IoT nas caixas onde serão armazenadas as vacinas, o profissional que as recebesse no destino final seria capaz de, apenas com um smartphone, acessar todas as informações de trajeto. Ele, inclusive, teria a prerrogativa de rejeitar lotes comprometidos.

Então, é evidente a necessidade de sermos mais proativos, agindo diretamente na prevenção dos incidentes por meio da tecnologia. Se governos deixarem para aplicar as multas e sanções somente após detectadas as empresas mal intencionadas, que farão o transporte inadequado das vacinas, muitas vidas poderão ser perdidas neste meio tempo. Portanto, os riscos já foram detectados e as soluções já são sabidas. Resta saber como governos irão agir e se nós, enquanto cidadãos, vamos cobrar e fiscalizar.

Daniel Schnaider é CEO da Pointer by Powerfleet Brasil, líder mundial em soluções telemetricas para redução de custo, prevenção de acidentes e roubos em frotas. Integrou a Unidade Global de Tecnologia da IBM e a 8200 unidade de Inteligência Israelense. É jornalista, autor e economista pela universidade Haptuha de Israel e pioneiro do comércio eletrônico e pagamento digital.

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A cura para a Covid-19 reside na Internet das Coisas